quinta-feira, 6 de março de 2008

Interiorização da violência

Hoje de manhã, no carro, escrevi mentalmente um monte de coisas para colocar no blog, mas aí cheguei no trabalho, me ocupei com outras e o tempo foi passando. assim como a inspiração.
Vou priorizar um fato que fiquei sabendo ontem à noite. O filho de uma amiga, que tem uns 20 anos (o filho, não a amiga) foi assaltado quando voltava da faculdade à noite numa cidade do interior de Mato Grosso, Cáceres. Morei lá 15 anos e sou apaixonada pela cidade, que tem cerca de 85 mil habitantes e fica às margens do rio Paraguai.
Cidade aprazível, que responde pela alcunha de Princesinha do Paraguai. Mas, desde que cheguei lá, no final dos anos 80, já dava para perceber um triste fenômeno que agora já aparece nas pesquisas em nível nacional: a interiorização da violência. Ou seja, não dá para dizer que você está mais seguro em Cáceres do que no Rio de Janeiro, embora as pessoas de Cáceres (algumas, é claro) morram de medo do Rio.
Esse assunto dá margem para mil elocubrações. Penso na minha amiga, no filho que levou um tiro (de raspão, por sorte), mas penso também nas pessoas que estão do outro lado da violência e que são fruto também da violência da falta de oportunidades, da facilidade do acesso às drogas, da banalização das drogas (inclusive do álcool), da brutalidade da polícia, da corrupção, dos políticos que não promovem políticas visando melhorar as condições de vida da população.
Imagino que algumas pessoas vão dizer que penso assim porque não foi o meu filho a vítima. Talvez. Mas, não posso deixar de pensar em meninos como o filho de um casal que trabalhava com a minha família na fazenda e que caiu no crime. Dizem (não tenho mais contato com eles) que roubou, matou, e fiquei sabendo também de fonte segura que apanhou tanto na cadeia que perdeu um olho. Era um menino bom quando o conheci. Os pais também eram pessoas boas, sem maldade, pantaneiros, gente criada no meio do "pantano" como eles dizem e que vem para a cidade na ilusão de que seus filhos vão ter uma vida melhor graças aos estudos. Tomara que alguns consigam, mas a maioria dos que conheci virou bandido, prostituta, entrou pra gangue, e alguns continuam peões.
Por isso lamento que cidades como Cáceres fiquem assim: à margem do desenvolvimento (seu IDH é baixíssimo), sem muitas perspectivas, embora seja sede de uma universidade estadual. De um lado, remanescentes das famílias tradicionais, muitos depauperados; de outro, uma classe emergente, que tem sempre questionada a origem do dinheiro e que parece (alguns representantes) não ter muitos escrúpulos. De modo geral, todos acuados (alguns beneficiados, talvez) pela miséria. Retrato do Brasil.

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