sexta-feira, 10 de dezembro de 2021

Lançamento de "O portão do inferno - Casos arquivados"



Foi uma noite muito especial, a começar pelo local: a Casa Barão de Melgaço, no Centro histórico de Cuiabá. Construída entre 1775 e 1777, e inaugurada em 1802, ela serviu de moradia a partir de 1843 para o Almirante Augusto João Manuel Leverger, que foi presidente da Província de Mato Grosso e passou à história como Barão de Melgaço.

Hoje o imóvel é sede do Instituto Histórico e Geográfico de Mato Grosso e da Academia Mato-grossense de Letras, e os bustos e retratos do morador famoso e outros intelectuais célebres de Mato Grosso dividiram espaço na noite de 9 de dezembro com personagens do livro "O portão do inferno - Casos Arquivados" (Entrelinhas Editora).



Estavam lá a noiva Teodora, o casal de facínoras Lucinda e Jorge (a fina flor da sociedade), Orlando e Romeo, e Dolores, todos carregando no corpo e no olhar as marcas adquiridas em vida. E havia ainda uma pianista pálida martelando uma melodia inquietante nas teclas do instrumento que pertenceu à Dunga Rodrigues.


Tudo isso aconteceu em meio ao lançamento de "O portão do inferno - Casos arquivados", romance de estreia de J.R.N. Ferreira. O Salão Nobre da Casa Barão de Melgaço estava repleto de amigos do músico Jefferson Roberto Neves Ferreira.

Ao lado da editora Maria Teresa Carrión Carracedo e do designer Mike Vanni, ambos da Entrelinhas, e da jornalista Martha Baptista, esta que vos fala, Jefferson apresentou J.R.N. Ferreira, que se lança no mercado editorial com um livro arrebatador e aterrorizante.

Foi em janeiro de 2014 que ele começou a escrever a história que resultou em "O portão do inferno - Casos arquivados", aproveitando um ano em que estava de mal com a música. O incentivo do amigo Thiago Bazzi fez com que acreditasse no potencial da trama, que foi sendo desenvolvida com muitas pesquisas e perambulações de bicicleta pelo Centro de Cuiabá, em busca de informações, referências históricas, os tais "casos arquivados".

Em janeiro de 2015, o livro estava pronto e para escrevê-lo o autor se inspirou em alguns personagens que fazem parte das chamadas "lendas urbanas" da capital mato-grossense. Leitor voraz de Agatha Christie, Stephen King e Raphael Montes, e fã incondicional da série "American Horror Story", produzida por Ryan Murphy, ele desenvolveu uma trama envolvente e personagens absurdamente fortes. Alguns são detestáveis, outros despertam a compaixão do leitor.

Em 2019, Jefferson apresentou seus originais para mim, a amiga coralista (ele é fundador e regente do Coro Experimental MT) que gostava muito de ler (e escrever). Apesar de não ser meu gênero preferido de literatura, não consegui parar de ler. Desse contato com a obra, nasceu a ideia de apresentá-la à editora Maria Teresa, que, embora também tenha sentido um certo estranhamento, devorou as 300 páginas do livro num final de semana. 

O designer Mike Vanni, o autor Jefferson Neves, a editora Maria Teresa e a jornalista Martha Baptista 

"Não me lembro de nenhum autor mato-grossense que tenha tido o atrevimento de seguir na direção das séries policiais e noir da Netflix, contextualizando-as neste espaço-tempo", diz Maria Teresa. 

O espaço é Cuiabá e a estrada que leva à Chapada dos Guimarães, com destaque para o local conhecido como Portão do Inferno. O tempo é a década de 1940 e a atualidade. 

O autor brinca com as noções de tempo, vida e morte, realidade e ficção para fisgar seu leitor e torná-lo "testemunha, cúmplice e vítima de situações perturbadoras". 



O livro está disponível na loja virtual da Entrelinhas (www.entrelinhaseditora.com.br). É uma oportunidade ímpar para conhecer um novo escritor, que diz estar cheio de ideias para novos projetos nesse campo. Eu, pelo menos, já estou louca para ler o próximo livro. 

Os personagens que surpreenderam o público durante o lançamento foram interpretados por Manoela Cavalcanti, Wagton Douglas, Gabriel Amaral, Hector Kirizawa, Tayta Moraes, Yasmin Moreira e Hyanna Toledo  A maquiagem ficou a cargo de Manoela e Ló, e a caracterização dos personagens contou com a colaboração de Luiz Pita.  Fotos de Ricardo Carrión Carracedo. 







quinta-feira, 30 de setembro de 2021

"Simples Assim " reúne Vera Capilé, Jefferson Neves e Martha Baptista no Garden Pub



Nesta sexta-feira (1º de outubro), Vera Capilé, Jefferson Neves e Martha Baptista sobem ao palco do Garden Pub para fazer o que lhes dá muito prazer, em meio a mil e uma atividades: cantar.

Vera é psicóloga, cantora, compositora, atriz e escritora, entre outras facetas de sua personalidade destacada recentemente pelo projeto Mestres da Cultura, realizado com recursos da Lei Aldir Blanc. Natural de Dourados (MS), está muito feliz com a notícia de que receberá em breve o título de Cidadã Mato-grossense, outorgado pela Assembleia Legislativa de Mato Grosso.


Foto Fred Gustavos
O cuiabano Jefferson Neves é compositor, arranjador, cantor, escritor, fundador de vários grupos vocais (como o Alma de Gato e Mesa pra 6) e dirige o Coro Experimental MT desde 2017.

Foto Dizão

Martha Baptista também vem da parte sul do antigo estado de Mato Grosso (de Corumbá), morou muitos anos no Rio de Janeiro, outros tantos em Cáceres, e trabalha em Cuiabá como jornalista e escritora.

Foto Dizão

Desde 2017 Vera, Jefferson e Martha têm um encontro semanal marcado no Coro Experimental MT. E foi lá, em meio a várias apresentações que descobriram outras afinidades transformadas em matéria-prima do show "Simples Assim", cuja estreia aconteceu em março de 2020, uma semana antes do início da pandemia deflagrada por uma nova espécie de coronavírus. 
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“Nossa proposta inicial foi cantar o que nos emocionava, evocava emoções passadas ou simplesmente nos renovava a energia vital”, comenta Martha Baptista.

Por conta da pandemia, não foi possível fazer novos shows presenciais, apesar da boa receptividade do público, mas este ano, em meio à retomada de algumas atividades culturais – cercada dos cuidados necessários -, Jefferson entendeu que era o momento de reunir o trio para mais uma edição de “Simples Assim”. O show, a ser apresentado nesta sexta-feira, é totalmente diferente do primeiro e ganhou a participação de novos músicos, porém a essência continua a mesma.

“Todos nós tivemos liberdade para propor canções, que serão apresentadas em duetos ou trios, e outras que serão interpretadas como solo. Com isso, o show ganha em diversidade, contando, inclusive, com um bloco internacional”, conta Vera.

A direção musical ficou a cargo de Jefferson Neves, que convidou os músicos Thiago Costa (bateria) e Samuel Ribeiro (baixo) para darem aquele molho especial, e Eduardo Santos para acompanhar os cantores no violão e na viola. Jefferson também atua como pianista em diversos momentos.

“Minha vida anda bem agitada, mas é um prazer enorme poder cantar o que gosto, do nosso jeito”, diz Jefferson, que sempre surpreende o público com sua ousadia na releitura de clássicos da MPB e da música internacional.

E é dessa forma, simples assim, que Jefferson, Vera e Martha vão se apresentar no agradável espaço do Garden Pub, interpretando canções de autores como Ivan Lins, Milton Nascimento, Edu Lobo, Vander Lee, Eduardo Gudin, Sérgio Bittencourt, e – como não poderia deixar de ser -  de Chico Buarque – uma paixão tão grande dos três cantores que até mereceu um bloco exclusivo.

Serviço
O que: Show “Simples Assim”
Onde: Garden Pub
Quando: 1º de outubro, às 20h
Informações: 65-98405.3085
Reservas: 65-99351.4532 (Johny)   

sexta-feira, 3 de setembro de 2021

Filhote desse lugar


No início da noite desta primeira quarta-feira de setembro, sob um calor enlouquecedor, corri para o Sesc Arsenal, no Centro de Cuiabá, onde por aproximadamente 50 m, relaxei, ri e me emocionei com o documentário “Filhote deste lugar”, dirigido por Juliana Capilé, que faz parte do Projeto Mestres da Cultura – Uma homenagem à Vera Capilé.

Tenho o prazer de conviver com Vera mais assiduamente desde 2017 quando nos tornamos colegas no Coro Experimental MT. Nesses últimos quatro anos a gente se aproximou muito e conheci a Vera avó, mãe, irmã, esposa, cozinheira, costureira, psicóloga, gerontóloga, que convive muito bem com a Vera cantora, coralista, compositora, atriz e escritora.  Que mulher danada!

Mesmo assim, eu me surpreendi com “Filhote deste lugar”, que é também o título de uma das composições de Vera Capilé.

Como resumir 60 anos de carreira e 72 anos de vida em cerca de 50 minutos? Pois Juliana Capilé e sua equipe conseguiram fazer isso com maestria! É o tipo do documentário que dá vontade de ver e rever e rever porque são tantos detalhes, é tanta informação, que se torna impossível registrar tudo de uma vez.

Mas o mais importante é perceber a grandeza de Vera. Ela é muito maior do que aparenta ser! A menina atrevida, travessa, que viveu intensamente sua infância em Dourados (MS) e a juventude numa Cuiabá provinciana e, ao mesmo tempo, cheia de vida, encontros, cultura, foi acumulando diversas experiências ao longo das décadas.

Participou do saudoso Projeto Pixinguinha, com o qual levou a cultura mato-grossense à Europa e a outros estados brasileiros; uniu-se a vários parceiros artísticos e acabou aterrissando no Coro Experimental MT para acrescentar uma vivência nova: a de ser coralista.

Disciplinada, generosa, abriu portas para novos artistas e sempre foi muito amiga dos amigos, como o ator Liu Arruda (1957-1999) – uma amizade que rendeu alguns dos momentos mais emocionantes do documentário.

Minha intenção aqui não é contar tudo. Não quero lhe tirar, caro(a) leitor(a), o prazer de assistir a “Filhote deste lugar”. Mas aproveito para destacar a qualidade técnica do documentário, com fotografia e som impecáveis, sem falar, é claro, da trilha sonora. Uma legião de artistas e amigos de Vera, de Mato Grosso e de outros estados (e até do exterior), desfila no documentário em depoimentos que se entrelaçam e se complementam com um único objetivo: contar um pouco da carreira de Vera Capilé e mostrar por que ela merece como poucos o título de Mestre da Cultura.

O documentário “Filhote deste lugar” foi produzido com recursos da Lei Aldir Blanc da Secretaria de Estado de Cultura, Esporte e Lazer de Mato Grosso (Secel-MT), graças ao projeto apresentado e coordenado por Tatiana Horevicht. Nessa quarta-feira foi distribuído ao público um livro como parte da homenagem à Vera Capilé e ele traz como inovação um QR Code, que permite o acesso ao álbum comemorativo “Vera Capilé – 60 anos de Carreira”.

Nessa mesma noite a homenageada autografou seu livro “De Matto-Grosso a Mato Grosso – Das fronteiras paraguaias ao centro geodésico da América do Sul: a trajetória de um caminhante” (Entrelinhas Editora – 2021), também publicado com recursos da Lei Aldir Blanc. Nesse livro, ela conta a história de seu pai Sinjão Capilé, que faleceu em 2015, aos 99 anos, e é até hoje sua grande inspiração.

É ou não é uma mulher danada?

PS. Fotos e arte do projeto são de autoria de Fred Gustavos.


sábado, 17 de julho de 2021

Lixo e falta de educação




Ontem falei do lado bom de sair pelas ruas de Cuiabá com meu cachorro Juca, mas hoje quero falar de um aspecto bem feio da cidade: como a capital de Mato Grosso está suja!

Gostaria de ter várias imagens para comprovar o que digo, porém a agitação de Juca não me permite tirar as fotos que gostaria. Hoje, por sorte, consegui fazer um registro na Praça Oito de Abril, por volta de 7h da manhã! 

Adquiri o hábito de sair com Juca de manhã e no final da tarde. A gente varia o itinerário, mas temos alguns pontos fixos, como algumas praças próximas ao meu prédio, situado no bairro Popular. 

Em praticamente todas sempre encontro muito lixo acumulado: sacos plásticos, embalagens vazias (de quentinhas, sanduíches), sacolas de papel, caixas de papelão (ou isopor) e muitas garrafas de vidro (as populares long necks) e de plástico. 

Também encontro muitos varredores de rua, que trabalham para a Prefeitura. 

Em algumas praças, como a Praça Popular, onde estão situados vários bares, e na Oito de Abril (também conhecida como Praça do Choppão), há muitas lixeiras. Ninguém pode alegar falta de um local adequado para jogar seu lixo. Mas as pessoas parecem que fazem questão de deixar seus restos jogados como se fossem cães marcando território. Alguns chegam ao cúmulo de jogar o lixo no meio de um canteiro para dificultar o trabalho de quem recolhe a sujeira deles. É revoltante!

A gente tem ido muito a uma pracinha (Manoel Miráglia), que fica na esquina da Avenida das Flores com a Rua General Ramiro Noronha, no bairro Jardim Cuiabá, e lá não há lixeiras. Para piorar a situação, ela se transformou num ponto de apoio de entregadores por aplicativo, que também acumulam muito lixo.

Resumo da ópera: a Prefeitura podia instalar mais lixeiras em alguns locais, porém muitas pessoas parecem estar se lixando para esse tipo de recipiente. Ou seja, faltam educação e senso de civilidade. Sabe aquele habito de colocar qualquer pedaço de papel no bolso ou na bolsa? Pois é, eu sou assim e não vejo mérito algum nisso. Se tive algum mérito foi passar isso para minhas filhas, que também são incapazes de jogar uma lata (ou uma garrafa) na rua. 

Eu nem falei da situação de ruas e calçadas (quando existem) ... A quantidade de lixo e mato mesmo em ruas centrais é impressionante!

Fica aqui o meu registro. Talvez não adiante de nada, mas peço a quem me ler que ponha a mão na consciência e pense: que tipo de cidade estamos construindo e deixando para nossos filhos/netos/bisnetos? Como podemos mudar essa situação?

Aproveito a postagem, lançada ao vento, para fazer um apelo à Prefeitura de Cuiabá: por favor, aproveite os espaços vazios em alguma das praças dos bairros Goiabeira, Popular ou Jardim Cuiabá, para criar um "parcão", uma área exclusiva para cães, a exemplo das que já existem no Jardim das Américas e na Morada de Ouro.  Além das praças mencionadas acima, temos como opção a Praça Santos Dumont, que está super abandonada, e a Praça Clovis Cardoso. 


sexta-feira, 16 de julho de 2021

Apaixonados

 




Já passou da hora de escrever um novo post sobre Juca. Afinal são mais de quatro meses de intensa convivência. 

Há quem diga que só publico fotos de Juca, que só falo de Juca. Não sei se devo me preocupar com isso. O fato é que sempre fui razoavelmente discreta em relação à minha vida social e pessoal. Minhas filhas estão longe; não vou ficar publicando postagens sobre o meu trabalho, portanto, nada mais natural que Juca seja o modelo da vez.

É interessante como os animais aproximam as pessoas. Numa mesma saída sou capaz de conversar com um trabalhador braçal da Prefeitura de Cuiabá que está tirando o mato de um canteiro na praça e com pessoas que estão passeando com seus cachorros. Dou bom dia para cães presos em casas, que latem desesperadamente quando Juca desfila na sua porta; para a faxineira que limpa a calçada em frente ao prédio e me vê passar diariamente, e para qualquer pessoa que olhe para nós, por empatia ou medo. Respondo delicadamente quando perguntam: "Ele morde?" Entendo que alguns evitam a aproximação por traumas de infância e há também quem faça cara feia porque não gosta mesmo de cachorro. Não sabe o que está perdendo.

Nesse meio tempo, estabelecemos - Juca e eu - uma rotina draconiana. Acordamos (ou melhor, ele me acorda) por volta de 6h30 e saímos para o passeio matinal o mais rápido que eu conseguir. Em geral, Juca me espera deitado na porta da casa alternando momentos de compreensão com a minha lerdeza com outros de impaciência. Nossos passeios, que começam com a parada para o longo xixi, têm itinerários variados e duram aproximadamente uma hora - o tempo necessário para outros xixis, cocô e a exploração do caminho sempre na esperança de encontrar algo para comer.

Não! Juca não passa fome em casa, mas percebo que é do seu instinto fuçar a grama, o mato, o lixo, em busca de "tesouros". Às vezes, consigo impedir que o "tesouro" seja devorado (já peguei ele com um ratinho e um passarinho morto na boca), mas em muitos casos, não dou conta. 

De uma hora para outra, minha casa deixou de ser um campo minado de xixi. Faz um bom tempo que Juca não faz suas necessidades em casa. Somente na rua, nos passeios matinal e vespertino. 

No fim da tarde, volta e meia, a gente dá um passeio maior: vai até o pet park do Shopping Estação ou de algum espaço público. É bem gostoso. Só não vou todos os dias porque é preciso pegar carro e nem sempre estou a fim de enfrentar o trânsito. 

A propósito, na sexta-feira passada, no caminho para o Shopping Estação, Juca quase me matou de susto: no percurso até o Trevo do Santa Rosa, de trânsito invariavelmente lento, ele simplesmente pulou pela janela traseira. Puxei o freio de mão, abri a porta e me deparei com um cachorro pendurado pelo peitoral e a guia que estava presa no cinto de segurança do carro. Joguei-o pela janela de volta pro banco traseiro e fechei os vidros por medo de outra tentativa de fuga. Coitadinho! Acho que ele estava morrendo de vontade de fazer xixi e cocô, e estressado de ficar dentro do carro.

Já percebi que ele não gosta muito de andar de carro, por isso evito os passeios motorizados.


No mais, Juca é um amigo querido, que me olha de uma forma absolutamente arrebatadora. Às vezes, ele é teimoso, chato, e sei que não sou a melhor "educadora" do mundo. Aliás, não faço o menor esforço para adestrá-lo. Mas fico encantada com a sua memória, inteligência e empatia.

Há alguns dias nos deparamos com um vizinho caído na calçada e Juca parecia estar participando da situação. Quando tentei "me livrar" dele, atendendo à sugestão de uma moça que tínhamos acabado de conhecer de levá-lo para o pet shop da rua junto com seu cachorrinho, ele se recusou a ir com ela. Tive que eu mesma levá-lo para poder retornar no intuito de ajudar o senhor acidentado.

Ontem, assim que saímos de casa, fomos recepcionados por dois cães (uma fêmea vira-lata e um macho pequeno, de raça), que não pareciam ser moradores de rua. Logo desconfiei que eles pertenciam a uma casa vizinha ao prédio e, após alguns minutos, consegui chamar a atenção da dona de casa, que contou que os dois tinham fugido e ela não tinha conseguido alcançá-los. Juca e eu fomos então atrás dos dois, que já estavam se afastando novamente, e conseguimos atrai-los de volta para a alegria de sua tutora, que até nos convidou para entrar em sua casa. 

Juca é um cachorro ativo e muito inteligente. Imagino como seria sua vida num sítio ou numa fazenda, onde tivesse toda a liberdade de correr, caçar, comer o que quisesse... Mas, quis o destino, que ele viesse morar comigo num apartamento e por isso procuro oferecer o melhor que posso. Ontem, no final do passeio, descobrimos uma sorveteria no bairro Jardim Cuiabá que vende picolé para pets - o PETcolé. Ele adorou, chupou o picolé de melancia como se tivesse tomado picolé a vida inteira. Fofo!


Este é um resumo de nossa vida nestes últimos meses. Minha intenção é fazer um registro a cada três/quatro meses para mostrar as diferentes etapas da vida do meu Juca.  Esqueci de dizer que adoro o jeito de Juca dormir e também que acho que ele está me tornando uma pessoa melhor. 






quarta-feira, 24 de março de 2021

Cãofinados

Em tempos de pandemia, sob o pior governo que poderíamos ter, há que se buscar motivos de alegria, como pura forma de sobrevivência mental. Sendo assim, no último dia 14, após um ensaio do Coro Experimental inspirador, na chácara da Igreja Mestre Irineu, em Várzea Grande, o "poder da floresta" me levou a tomar uma decisão arriscada: adotar um cachorro. 

Não pensei muito, não racionalizei, simplesmente mandei uma mensagem para Ângela Piran, idealizadora e uma das responsáveis pelo Abrigo Melhor Amigo, e a consultei sobre a minha vontade de ter um animal de estimação, mesmo morando em apartamento. É claro que ela só me deu boas razões para acreditar que poderia dar certo. Perguntou se eu já tinha uma ideia sobre qual animal adotar e mencionei um cãozinho que vi numa das postagens do Abrigo no Instagram. Seu nome era Tuco. Ela adorou minha sugestão e disse que ele era o último filhote de uma cria. Ou seja, seus irmãos haviam sido escolhidos e ele não. Por quê? Não sei, já que me pareceu lindo na foto. 

Ângela ficou de trazê-lo no dia seguinte, logo após o almoço. Achei que teríamos uma longa conversa com informações, etc, mas a entrega foi rápida, na calçada, já que ela tinha outro cão no carro para levar do outro lado da cidade. 

Voltei para casa com um filhote no colo e meio sem saber o que fazer.  A primeira tarde foi de puro estranhamento e ele permaneceu como um anjo deitado na passagem entre a cozinha e a sala. Saí para comprar ração e voltei com cama, brinquedos, xampu, tapetinhos, etc. Ah, tomei a decisão de mudar seu nome e, sem motivo aparente, escolhi Juca, que lhe caiu como luva. 

No dia seguinte, Juca já se sentia dono do apê, circulando por todos os cômodos. Escolheu o quarto vazio das minhas filhas (e de hóspedes) como banheiro, apesar dos tapetinhos espalhados pela área de serviço. 

No final da tarde de quinta-feira, confesso que me bateu um desespero: eu não conseguia trabalhar (estou escrevendo um livro),  já que precisava ficar de olho nele (sempre em busca de algum canto novo para morder), meu apartamento virou um campo minado de xixi e cocô, e Juca parecia adorar especialmente a brincadeira de me morder.  

Por sorte, consegui falar com uma amiga "cachorreira" (Ana Helena), que me consolou e me deu algumas dicas fantásticas, além de ter me indicado o caminho dos vídeos de pessoas especializadas em ensinar aos incautos, como eu, a adestrar seus filhotes. 

Aos poucos, fui me instruindo, me acalmando e hoje sei que não abriria mão de Juca. Minha casa continua um campo minado (é difícil ensinar o filhote a usar o tapetinho!), consegui voltar a trabalhar e aprendi que de vez em quando preciso deixar o texto no meio de um parágrafo para lhe dar atenção.  Entre outras coisas, aprendi que não devo liberar todos os cômodos da casa para o filhote e fechei a porta do quarto de hóspedes e do "escritório". Com isso, ele ainda não decidiu qual é o melhor lugar para fazer suas necessidades: a sala ou a área de serviço. Acredito que estamos progredindo nesse quesito: hoje ele fez "parte" do xixi no tapetinho.

Suas brincadeiras preferidas são "cabo de guerra", que fazemos com uma antiga faixa de uma roupa de malha que usava quando vim para Mato Grosso (no final dos anos 80), bola, "disco voador" (uma adaptação feita com uma tampa de plástico) e, naturalmente, me morder. Mas aprendi que não posso deixar que se acostume a me morder em hipótese alguma e devo sempre substituir meus braços e canelas por algum brinquedo. Nem sempre funciona e, quando isso ocorre, o jeito é ficar braba e dizer em alto e bom som: "Não", "Shi....." ou algo no gênero. Acaba funcionando, embora minhas mãos, braços e pernas já tenham algumas marcas de seus dentinhos afiados.

No sábado, tive que sair para o ensaio do Coro na chácara e quase morri de preocupação. Deixei-o "preso" na área e na cozinha, devidamente alimentado, mas com água, sua caminha e brinquedos. Deu certo. Encontrei-o tão quieto que achei que tinha sido abduzido.

 No domingo, aconteceu a mesma coisa e ontem fui a uma consulta médica sem dor na consciência.  Juca tem seus momentos de surto e eu o entendo porque deve ser meio chato ficar preso num apartamento. Estou louca para passear com ele, porém a dra Denize, a veterinária, disse que isso só poderá acontecer após o dia 5 de abril quando ele terá tomado a quarta dose da vacina.

Em suma, estamos confinados, ele e eu, embora eu dê minhas escapulidas para ir ao mercado, ao médico e aos ensaios do Coro Experimental.  Estamos nos conhecendo e desenvolvendo uma amizade, que espero ser longa, duradoura e prazerosa para nós dois. Se você me perguntar hoje se estou arrependida, direi: não!  Preciso dizer que Juca é acumulador (é bem possessivo em relação a seus "brinquedos") e já está destruindo o seu segundo "ossinho" fake. 

sábado, 13 de fevereiro de 2021

Canto e danço que dara



Resenha é um gênero de texto caracterizado por transmitir a opinião de uma pessoa sobre um determinado conteúdo, que pode ser um livro, um filme, uma peça teatral ou um show. Em outras palavras, resenha não é resumo, ou mera descrição, ela tem um caráter opinativo. Mas também tem o desejo de compartilhar e é isso que me move ao resenhar a apresentação do músico Jefferson Neves, no espaço Garden Pub, na noite da última quinta-feira (11/02).

Há um ano, comentei aqui neste blog outra apresentação de Jefferson, que aconteceu no bar Fuzuê. É importante mencionar esse primeiro show porque ele serve como referência e eu me toquei disso no momento que conversava com amigos após o show desta quinta-feira.

É difícil falar sobre Jefferson porque ele é meu amigo, meu professor de canto e maestro/regente/arranjador do Coro Experimental MT do qual faço parte.

Pois é, Jefferson é tudo isso, mas tem um ano que ele vem se aventurando/revelando como intérprete e botando a cara - e o corpo - no palco para se apresentar como solista. O artista, que já se apresentou como solista junto com a Orquestra do Estado de Mato Grosso e do Coral UFMT, sempre usou a sua voz de barítono e a técnica para executar peças eruditas. Também passou um bom tempo se apresentando ao lado dos companheiros dos grupos Alma de Gato e Mesa pra Seis, sempre bem acompanhado e fazendo a parte mais percussiva na maioria das vezes. 

Agora ele faz o que bem quer. 

Escolhe seu repertório - e que repertório! -, os músicos com quem quer se apresentar e manda ver: "Canta e danço que dara" - diz Jefferson numa das primeiras canções do show: "Odara", de Caetano Veloso.

Senta-se ao piano para apresentar "Arrastão" de Edu Lobo e confunde a plateia por alguns segundos quando se levanta aos acordes de uma canção de Milton Nascimento ("Vera Cruz") dedilhada na guitarra por Sidnei Duarte. 

Sempre em boa companhia (além de Sidnei, os músicos Thiago Costa na bateria e Samuel Ribeiro no baixo), entrega uma interpretação belíssima de "Inútil paisagem" (de Tom Jobim e Aloysio de Oliveira).

Mistura standards de jazz, como "Flying to the moon" e "Cheek to cheek" com pop, trazendo uma versão maravilhosa de "Born this way", de Lady Gaga (uma de suas paixões), e ousa com uma versão reggae do clássico "Summertime" (canção de George Gershwin, da ópera "Porgy and Bess"). 

Canta samba ("Canto das três raças", de Mauro Duarte e Paulo César Pinheiro), abusa de seus dotes musicais na canção "Vou deitar e rolar", de Baden Powell e Paulo César Pinheiro, um clássico do repertório de Elis Regina. 

Quando a gente acha que já viu tudo, ele nos desconcerta com "Zero", a bela canção de Liniker.

Falta dizer alguma coisa? Eu estava ali como plateia, então não tomei notas e sequer fiz um esforço de registrar tudo na memória. Apenas curti e gostaria de ouvir tudo de novo. 

Fico super orgulhosa do meu amigo versátil que está descobrindo sua voz e o prazer de cantar o que gosta. Simples assim? Nem tanto. Tudo isso é fruto de muito estudo, muito trabalho, muito talento e de uma trajetória singular. Em 2019, Jefferson acompanhou como cantor o grupo Flor Ribeirinha em sua excursão europeia e, com certeza, teve que sair de sua zona de conforto para participar de mais de uma apresentação por noite.

Em 2020, além do já citado show do início do ano, fez algumas lives solo no Ixpia o Festival e em seu Instagram.

Com isso, foi ganhando confiança (como se precisasse) e agora ninguém segura esse moço. Sorte nossa que continuaremos desfrutando de apresentações tão singulares. Que venham mais shows!

Antes que eu me esqueça, o espaço no Garden Pub é delicioso, super arejado e agradável em tempos em que ainda é obrigatório evitar aglomerações. 


Uma pequena amostra do repertório de Jefferson Neves em vídeos bem amadores feitos para enviar aos amigos que não puderam acompanhar ao vivo e a cores. 







sexta-feira, 12 de fevereiro de 2021

Manoel

 


Escrever é uma forma de sentir. Por isso gostaria de compartilhar algumas lembranças do meu cunhado Manoel, que nos deixou nesta quarta-feira (10/02).

Manoel era do signo de Gêmeos como eu, e fazia aniversário três dias depois de mim, no dia 16 de junho.

Era uma pessoa do bem. Nunca o vi bravo ou com raiva de alguém. Se ele tinha motivos, guardava para si.

Eu o conheci quando era menina e, aos sete anos, fui dama de seu casamento com minha irmã Jandira, em 27 de julho de 1963. 

Como perdi meu pai em dezembro de 1961, meus cunhados (seis) foram um pouco meu pai, cada um do seu jeito e numa proporção. 

Manoel foi um dos que esteve mais perto de ocupar essa posição, mas é curioso: apesar da nossa diferença de idade, ele era mais um amigo, um parceiro em algumas situações. E o nosso mais forte laço foi por muito anos o futebol. Acredito que Manoel foi a pessoa com quem mais fui ao Maracanã. 

Não sei por que minha irmã nunca ia conosco - acho que ela ficava nervosa ou não gostava muito da ideia de ir ao estádio.  Com o tempo as lembranças vão ficando mais embaralhadas, mas eu me recordo especialmente de três situações.

Uma delas envolve um jogo internacional, acredito que entre as seleções do Brasil e Paraguai. O que me marcou nessa partida é que não me recordo de já ter visto o Maracanã tão lotado como naquela noite e me lembro de Manoel repetindo no percurso de ida que a gente não ia conseguir assistir ao jogo. Mas, apesar de todo o sufoco, a gente conseguiu e foi muito emocionante. Acho que o Brasil ganhou. Se não ganhou, ficou a lembrança de uma vitória.

Outra situação marcante foi uma partida disputada em dia de temporal. Quem mora ou conhece o Rio de Janeiro sabe o quanto o bairro do Maracanã fica inundado. Pois é.  Foi o que aconteceu nesse dia. Mas apesar da inundação conseguimos chegar ao carro, que estava cheio d'água.   

A situação mais dramática, entretanto, foi vivida numa volta do Maracanã em que Manoel atropelou uma pessoa numa rua do Centro. Por sorte, a vítima teve ferimentos leves, mas me lembro do susto, da calma que Manoel manteve durante o episódio e, se não me falha a memória, acho que transportamos a vítima (uma mulher) até o Hospital Souza Aguiar.

Eu me lembrei de algumas situações, porém não contei que Manoel - e eu, por influência dele -  era botafoguense e juntos vivemos uma época (anos 60/início dos anos 70) em que o Botafogo era o máximo, o Glorioso. A gente não ficava junto da torcida organizada, mas era tão lindo assistir a um jogo no Maracanã, ver o povo na Geral (um espaço onde o povão ficava de pé e se espremia bem perto do gramado), os cantos da torcida, o gramado ficando iluminado no entardecer! Era um programa maravilhoso! Às vezes íamos nas cadeiras numeradas, mas acho que era mais comum a gente se sentar nas arquibancadas. Nunca passei medo (a não ser naquele dia do temporal), nunca vi uma briga perto de mim, nunca me senti ameaçada. 

Com o passar dos anos, deixei de frequentar o Maracanã com Manoel. Acho que foi uma coisa natural, fui ficando mais moça e tendo outros interesses. O Botafogo já não me fascinava tanto e não me lembro exatamente em que ano Manoel foi convidado a participar da diretoria do Fluminense - que, na minha cabeça, era o arqui-inimigo do Botafogo por causa de uma final em que o Bota perdeu o campeonato no último minuto da partida por conta de um gol do tricolor Lula - e, pasmem, ele passou a torcer pelo Fluminense.

Manoel e Jandira tiveram apenas uma filha, Luciana, sobrinha querida, que hoje tem dois filhos (Sávio e Leandro), ambos rubro-negros fanáticos por influência do pai deles (Marco).

Mas, como eu disse no início, Manoel era de paz e sempre soube conviver bem com todos. Acredito que, no fundo, ele conseguia torcer pelos três times - Botafogo, Fluminense e Flamengo -, só não sei para quem torcia no caso de confrontos diretos entre eles.

Adorava ler, tinha uma biblioteca maravilhosa e gostava muito de música. Tinha uma voz bonita e era muito afinado.  No último domingo da minha recente temporada no Rio tive o prazer de vê-lo cantando. Ele gostava especialmente de cantores antigos como Nélson Gonçalves, Orlando Silva, e grupos como Demônios da Garoa.

Goiano da pequena Ipameri, Manoel foi primeiro para São Paulo, onde terminou o equivalente ao ensino médio. depois veio para o Rio de Janeiro para trabalhar com um parente. Moço de poucos recursos, teve vários empregos e fez faculdade de Direito - a única que conseguiu conciliar com o trabalho. Mas seu sonho, segundo a filha, era cursar Eletrônica.  Acabou conseguindo um emprego na Light, onde se aposentou após ter obtido cargos de destaque. 

Foi um companheiro incrivelmente amoroso para a minha irmã Jandira, que surpreendentemente partiu antes dele, aos 75 anos, vítima de um infarto. De uma família longeva, Manoel nos deixou aos 90 anos, também de forma natural.

A gente sabia que ele não ia durar para sempre, mas a sua partida nos deixa com uma sensação estranha ...  Acho que o nome disso é saudade... A sensação de que podíamos ter conversado mais, rido mais, contado mais piadas ou trocado mais experiências (eu me lembro de um dia em que ele me disse que todos éramos comunistas na juventude e que o meu esquerdismo também iria passar) ... A sensação de que vivemos uma vida boa, apesar de alguns percalços.

 E para finalizar, eu me lembro da emoção de Manoel quando nasceu sua única filha após algumas tentativas anteriores não bem sucedidas.  Era um bebê lindo, perfeitinho, bem miúdo ... Ele perguntou à enfermeira: "Mas ela vai crescer, né?" 

Ela cresceu e cuidou de seu pai da melhor maneira possível.  




segunda-feira, 25 de janeiro de 2021

O meu lugar

Foto de Luciana Silveira

Há dias quero deixar registradas algumas lembranças da minha recente temporada no Rio de Janeiro. Foi um período estranho. Não eram férias propriamente (trabalhei assiduamente e mantive minhas atividades on-line até a véspera do Natal) e ainda havia a sombra (e que sombra!) da pandemia.

Aliás, este foi um tema recorrente ao longo de mais de dois meses passados na casa de minha irmã no bairro de Ipanema. Não havia consenso na própria família e cheguei à conclusão que em matéria de Covid-19 cada um tem uma opinião, usando os argumentos e os fatos (ou fake news) a seu favor. Não tentei convencer ninguém da "minha verdade" e sobrevivi a esses embates.

Tudo melhorou quando recorri a uma lição já apreendida em viagens passadas. Caminhe, respire fundo e vá em frente. Tudo fica melhor. Nem sempre dava para seguir isso à risca porque houve dias seguidos de chuva e aí era impossível sair caminhando debaixo d'água, correndo o risco de pegar uma gripe que poderia ser confundida com Covid. Porém a volta do sol (ou, pelo menos, de um dia nublado) era saudada com muita alegria. 

Nessas idas e vindas, a melhor parte foi redescobrir alguns lugares do Rio. Por conta dos riscos da pandemia, não valia a pena ir muito longe, ficar pegando transporte público ou carros via aplicativo. Mesmo assim fiz um passeio delicioso no velho Aterro do Flamengo, um lugar que mora no meu coração, já que passei a maior parte da minha infância e juventude no bairro do Flamengo. Realizei um sonho ao passear de bicicleta com uma de minhas sobrinhas no Aterro. Confesso que fiquei com um pouco de medo pois não pedalava desde 2013, mas foi muito gostoso. Deu aquele gostinho de infância, que é até difícil de descrever. Na volta, fiz questão de fazer uma foto diante da minha primeira escola. 


Outro lugar redescoberto foi a Lagoa Rodrigo de Freitas, situada a duas quadras de onde estava hospedada. Que lugar estupendo, cheio de nuances! Aos finais de semana, há muita gente e é um pouco estressante passear se esquivando de ciclistas e transeuntes em geral, mas nos dias comuns a Lagoa fica mais tranquila. Encarei a volta completa (sozinha) três vezes - um percurso de aproximadamente 7,5 km. Confesso que da primeira vez foi duro, porém o fato de não ter levado dinheiro acabou me propiciando um encontro delicioso com Luciano, o "doutor em coco", que me vendeu fiado sem nunca ter me visto mais gorda. É claro que voltei para pagar a dívida e virei freguesa. 



Também tive o prazer de retornar ao Jardim Botânico, um lugar único que nunca me canso de visitar. Caminhar por suas alamedas é uma experiência que recomendo a todos os amigos (e aos inimigos também). E pensar que morei tão perto perto de lá e, durante um tempo, até corria no Jardim Botânico!

Mas a cereja do bolo nesta minha temporada pandêmica foi a Praia do Arpoador. Nunca fui frequentadora do Arpoador e nas últimas vezes que fui ao Rio sempre ia até o final da praia pelo calçadão para apreciar a bela vista do Morro Dois Irmãos, com a Pedra da Gávea ao fundo. Desta vez comecei a caminhar pela areia indo até a altura do Posto 9, quando me encontrava com duas sobrinhas, e íamos até o final do Arpoador para mergulhar bem no cantinho, um lugar mágico onde quase sempre a água parece limpa e o mar menos forte do que no restante de Ipanema.  Em alguns dias, a temperatura estava gelada e dava até para ver peixinhos... 


Como íamos relativamente cedo, não havia aglomeração, a não ser de cachorros em alguns trechos. Eu amava e ficava imaginando ter a companhia de Lola (a cadelinha da minha filha Marina, que hoje mora em Goiás).  Por coincidência, compartilhei algumas idas à praia com uma amiga querida recém-chegada de Paris e, como ela estava hospedada no final de Copacabana, o Arpoador acabou sendo nosso ponto de encontro.  

Houve um dia em que, ao invés de caminhar pela praia desde o Posto 10, fui andando pelas ruas internas de Ipanema até o Posto 9. Foi tão bonito ver o movimento dos porteiros varrendo as calçadas. Parecia um balé sincronizadoNo caminho pude admirar as orquídeas que florescem na maioria das árvores.

O Rio tem fama de perigoso, é perigoso, e está muito degradado, mas quantas belezas esta cidade ainda nos oferece!  As ruas dos bairros têm vida. Teve um dia que fui e voltei de Ipanema a Copacabana a pé para ir a um dentista. Foi cansativo, mas compensador. Quando você caminha pelas ruas do Rio você vê movimento, vê pessoas dos mais variados tipos. E tem mais um detalhe, apesar da pandemia, as pessoas são simpáticas em geral: ainda é possível, se houver disposição, começar uma conversa do nada com alguém que você conheceu na praia, pedindo para olhar suas coisas durante um mergulho, ou até enquanto esperar o sinal abrir para atravessar a rua. 

 Sinto muita falta disso em Cuiabá. 

Nos meus primeiros dias de volta a Cuiabá, confesso que estranhei a ausência de pessoas nas ruas, em parte motivada pelo calor intenso e, em parte por um hábito cultural.  

Meu objetivo não é comparar as cidades ou me queixar do lugar onde estou (até quando? quem sabe?) e sim reviver momentos gostosos, e poder compartilhá-los com quem eventualmente ler esta crônica. 

Por isso agradeço imensamente à minha irmã Jane que me acolheu e a todos que compartilharem estes momentos tão agradáveis comigo. 

Até breve, Rio de Janeiro!

sexta-feira, 15 de janeiro de 2021

À minha irmã Junilza

Hoje minha irmã Junilza nos deixou. Mais do que irmã, ela foi minha mãe na minha primeira infância.

Quando nasci, Junilza tinha 22 anos (fez 23 alguns meses depois). Eu me lembro mais dela e de minha outra irmã Jandira (que tinha 17) cuidando de mim do que minha própria mãe, que era muito dedicada a meu pai, na época com 62 anos e com problemas de saúde (ele faleceu aos 67)

São lembranças gostosas. Eu me lembro de Junilza fazendo "aviãozinho" para a irmã enjoada comer. Eu me recordo dela tocando piano quando já morávamos no apartamento da Rua Almirante Tamandaré, no Rio de Janeiro. Ela tocava "Num Mercado Persa" (de Albert Ketelbey) e eu era transportada para o Oriente, dançando como uma louca. 

Eu me lembro de quando viajou para a Europa numa excursão da Polvani e me encheu de presentes na volta.  Eu me recordo de dois bichinhos de feltro que fez para mim: um deles era um veadinho, que eu chamava de Bambi. Lindo!

Embora fosse mais velha que Jandira, Junilza se casou um ano depois, exatamente no dia 11 de abril de 1964. "Perdi" duas irmãs/mães em pouco mais de um ano e, aos poucos, minha outra irmã, Jane, foi assumindo este papel.

Junilza se mudou para o subúrbio do Meier e tenho boas lembranças dos finais de semana que passei lá num prédio pequeno, numa rua calma. Aos poucos, vieram os filhos - Augusto, Júlio e Simone -, e eu fui crescendo e cedendo o lugar de "filha". Eu me tornei a "tia", a comadre, já que batizei Augusto ainda menina, a convite de meu cunhado César. 

Junilza e família se mudaram para o Flamengo, ficando mais perto de nós por um tempo e, alguns anos depois, se transferiram definitivamente para Brasília. Nossos encontros, entretanto, continuavam relativamente assíduos. 

Anos depois, em 1997, quando viajei para os EUA a convite do Rotary Club de Cáceres, numa viagem de intercâmbio, ela, já viúva, atendeu meu pedido e ficou 15 dias cuidando de minhas filhas Diana e Marina (Anna Maria, minha irmã de Corumbá, tomou essa responsabilidade nos outros 15 dias). 

Desde então, nossa relação voltou a ficar muito próxima e nos tornamos irmãs de fato. Foram várias idas a Brasília e vi minha irmã florescer novamente. Ela era muito alegre, mãe dedicada e avó amorosa de Felipe e Leila. Como costurava bem!!! Entrou no grupo de costura da igreja e se dedicava com afinco às tarefas que lhe eram dadas. Participava de uma turma de alongamento e lá também cultivou belas amizades.

Nos últimos anos, não estava bem de saúde e quase nos deixou algumas vezes. Era magrinha, parecia frágil, mas como lutava pela vida. A gente conversava toda semana (em geral, nas noites de domingo) pelo telefone - longos papos em que falávamos sobre assuntos diversos, principalmente filmes, programas de TV, música e lembranças. 

Em 2018, passei o Natal com ela e, em julho de 2019, estivemos juntas pela última vez. Em 2020 - esse ano esquisito - não pudemos nos encontrar, mas parece que estivemos tão próximas! Ela assistiu à minha live no "Ixpia, o Festival" em setembro, e também acompanhou o meu "Papo de Quarentena" com Sofia Karam, nossa sobrinha-neta, em dezembro. 

Não sei dizer exatamente qual foi o último dia que nos falamos. Provavelmente foi logo depois do Natal. Sentia que ela estava cada vez mais cansada e queria poupá-la. Nas últimas três vezes que liguei sequer consegui falar com ela e sabia que não haveria milagre: minha irmã estava se apagando, concluindo seu ciclo entre nós.

A fé de algumas sobrinhas e amigas me consola. Sei que Junilza lutou o bom combate, foi íntegra e viveu intensamente seu amor por nossos pais, irmãos, seu marido, filhos e netos, amigos. 

Escrevi este texto para me permitir sentir a dor de sua partida e também para compartilhar algumas lembranças com meus sobrinhos.

 Escrevo ao som de Chopin - um de seus compositores preferidos. Junilza me ensinou a tocar piano. Hoje não toco mais. Infelizmente, vendi meu piano - o instrumento onde aprendi a tocar - quando este não conseguiu entrar no meu atual prédio. Ele me acompanhou até Cáceres nas diversas casas onde morei. 

Quem sabe um dia terei a oportunidade de tocar novamente "Tristesse" numa versão facilitada ou a "Sonata ao luar", de Bethoven, uma das minhas favoritas. Uma coisa é certa: sempre vou me lembrar de Junilza quando ouvir alguém tocando piano. Descanse em paz, minha irmã. Você ocupará para sempre um lugar muito especial no meu coração. 

PS. O nome Junilza vem da junção entre os nomes de nossos pais: Júlio e Nilzalina. Conheci há algum tempo uma caixa num supermercado de Cuiabá que se chamava Junilza. Foi a segunda Junilza que conheci.

Junilza em uma das fotos tiradas por seu filho Augusto César