segunda-feira, 27 de janeiro de 2014

No país das desigualdades

"O Brasil é um país muito injustamente desigual". A frase é do economista Eduardo Giannetti em entrevista à jornalista Marília Gabriela. 
Assisti a esse  trecho crucial da entrevista no final do expediente de hoje e é como se tivesse dado um click na minha cabeça. 
Não vou repetir tudo que ele diz aqui. Sugiro que quem me lê assista ao vídeo clicando no link: http://www.socialfly.com.br/videos/11-este-homem-resolve-deixar-a-baboseira-de-lado-e-resume-o-maior-do-problema-do-brasil-em-2-minutos
Sempre pensei como ele.  Acho absurdamente injusto que as pessoas não tenham as mesmas chances e condições mínimas de saúde, educação e moradia que eu tive.
"As condições iniciais em que as pessoas começam sua vida são absurdamente desiguais. Chegamos ao século 21 sem ter conseguido resolver um problema de agenda social do século 19, que é coleta de esgoto. E o Brasil quer fazer estádio, quer fazer trem-bala e quer continuar vivendo miseravelmente" - questiona Giannetti.
Nada contra fazer Copa do Mundo, sediar Olimpíadas (os protestos contra Copa podem ser assunto para outro post), mas não dá para querer fazer isso (mal e porcamente) sem ter resolvido o tal problema do século 19, que é saneamento básico!
Sempre ouço dizer que saneamento básico não dá voto para político porque ninguém vê. Isso é complicado. 
As mesmas pessoas que vivem no meio da merda (não tem outra palavra para descrever a situação) acabam elegendo políticos que só enfiam os pés na merda às vésperas de eleição em busca de votos, cheios de promessas que dificilmente serão cumpridas.
Sou de uma família de classe média, que já teve altos e baixos, porém nunca faltou comida na minha casa, sempre dormi numa cama gostosa e devidamente protegida do frio ou do calor, fiz minhas necessidades básicas num banheiro com descarga e pude tomar meu banho com tranquilidade (salvo alguns momentos de exceção em que faltou água no prédio no bairro carioca do Flamengo, onde passei boa parte da minha infância e adolescência).
Estudei em bons colégios particulares, passei no meu primeiro vestibular para uma universidade federal e, apesar de alguns altos e baixos, meu padrão de vida sempre se manteve. Vou e volto de carro para o trabalho, não enfrento ônibus ou trens superlotados com pessoas me espremendo ou bolinando, vou ao dentista quando sinto dor de dente e ao médico quando sinto algum desconforto. Faço exames preventivos anualmente e pude dar às minhas filhas quase todo o conforto que tive graças ao meu trabalho e ao apoio da família.
E então? Posso imaginar (imaginar, vejam bem) a dor de quem passa frio, de quem tem fome, de quem tem dor ou vê a dor de alguém que ama e não pode socorrê-lo. E isso - essa desigualdade - sempre me incomodou muito, desde que eu era criança.
Com o tempo, acho que fui criando uma espécie de capa, um cinismo que, uma vez desiludida com os caminhos da política que cheguei a cortejar quando jovem e com os caminhos da religião, me ajuda a seguir em frente. 
Mas, o gosto amargo, a sensação de incômodo diante da minha inércia e o vazio permanecem ... 
Dando continuidade aos meus questionamentos do post anterior: o que tenho feito para diminuir essa desigualdade? O que posso fazer para mudar essa situação?

www.rondoniadinamica.com



quarta-feira, 22 de janeiro de 2014

De volta à realidade

É com pesar que encerro meus relatos da recente viagem à Europa. 
Escrevê-los foi uma forma de compartilhar um pouco do que vivi, mas foi principalmente uma forma de prolongar o sabor de novidade, a imensa alegria de viajar ao lado da minha filha Marina e de atenuar minhas saudades.
Há 40 anos fiz minha primeira viagem à Europa, numa excursão intitulada "Universitários na Europa", organizada pela Agência Abreu (acho que nem existe mais). Na época, tive a feliz ideia de anotar num caderno comum o dia a dia da minha viagem que durou aproximadamente 40 dias. Volta e meia gosto de reler meus relatos e me divirto com o meu comportamento aos 17 anos.
Agora, novamente faço uma viagem ao Velho Continente no papel de mãe e ao retornar ao Brasil faço um diário das minhas aventuras neste diário virtual que é o blog.
O que mudou nesse período? Tanta coisa. A Europa mudou, o mundo mudou e eu naturalmente também mudei, mas ainda resta um quê daquela Martha adolescente, sensível, questionadora e inquieta na Martha de hoje, É claro que estou mais acomodada, mais cansada, porém ainda me inquieto e me incomodo com um monte de coisas. Difícil mesmo é conservar a esperança.
Sei que não posso focar no lado ruim das coisas e que não posso (nem quero) reclamar da vida. Sei que a minha vida é muito boa, comparada com a de muita gente. Mas me incomodo exatamente com isso: o que tenho feito para amenizar o sofrimento de outras pessoas? O que tenho feito para reduzir a corrupção e as injustiças de uma sociedade tão desigual? 
Não era esse o rumo que eu pretendia seguir quando iniciei este post, mas escrever é isso ... colocar no papel ou na tela o que vai dentro de nós, mesmo que seja a maneira com que a gente vê ou sente as coisas que acontecem ao nosso redor.
Não consigo me conformar que duas pessoas - uma criança e um jovem de 20 anos - tenham morrido afogados no Distrito Federal dentro de um veículo por causa de um alagamento, provavelmente decorrente de uma obra mal feita.
Não consigo me conformar com a política penitenciária brasileira que amontoa gente de mais alta periculosidade e ladrões de galinha em prisões, verdadeiros barris de pólvora que, volta e meia, explodem chocando o País, como aconteceu recentemente no Maranhão.
Estou cansada de políticos absurdamente corruptos e caras de pau como José Sarney e sua filha Roseana, que se eternizam no poder graças à ignorância e aos interesses das pessoas que os elegem.
E o que estou fazendo para mudar isso? Será que é possível mudar isso? Como mudar?


segunda-feira, 20 de janeiro de 2014

Pelas ruas de Amsterdam - de volta para casa

Meu penúltimo dia de viagem começou com uma surpresa: em vez de correr para pegar o ônibus ou ter que encarar meia hora de caminhada com malas pelas ruas de Dronten, ganhamos uma carona inesperada, de um dos rapazes franceses que mora com minha filha Marina. 
Ele ia levar a namorada também francesa para pegar o ônibus em Amsterdam e trazer outros amigos que chegavam à capital holandesa - um deles dono do carro.
Uma vez em Amsterdam, pegamos um trem e depois um tram (uma espécie de bonde) que nos levou até Musemplein, onde ficam os principais museus da cidade, como o Rijksmuseum.

Musemplein

Chovia um pouco e ficamos muito felizes de não termos que enfrentar a fila quilométrica diante do Museu Van Gogh, já que tínhamos comprado os tickets pela internet. Passeamos um pouco pela praça enquanto aguardávamos o horário marcado e comemos um cachorro-quente numa das barraquinhas existentes.
Pouco antes das 13h, procuramos a lateral do museu e esperamos nossa vez de entrar. O Museu Van Gogh é um fenômeno. Tinha estado lá aos 17 anos, na minha primeira viagem à Europa, e fiquei muito impressionada - com a beleza dos quadros de Vincent e com sua história. Na época conhecia um pouco de pintura graças a uma coleção maravilhosa da Abril Cultural (Gênios da Pintura) e, entre tantos artistas enfocados, tinha um xodó especial por Van Gogh - o pintor que cortou sua própria orelha e que morreu jovem (aos  37 anos) sem ter seu gênio reconhecido. Ele dependia do irmão Theo até para comprar tintas para fazer suas telas.
Não deixa de ser uma ironia: hoje,  pouco mais de um século depois, a arte de Van Gogh enche um museu imenso (com restaurante, lanchonete e loja) e movimenta zilhões de euros. Os quadros dele continuam belíssimos, de uma força expressiva incrível, mas não curto muito perambular por um museu tão cheio. Resumo da ópera: gostei da visita, mas não fiquei tão sensibilizada quanto na visita dos meus 17 anos. Parece que o museu cresceu demais, tem informação demais e talvez eu já estivesse meio cansada naquele dia - e com fome. 
Nem sei quanto tempo ficamos lá e assim que saímos seguimos em direção ao Centro - Dam Square  - para comprar a encomenda que faltava e alguns presentes.
O problema é que não estávamos num dia de consumidoras -  a causa talvez fosse a angústia de saber que no dia seguinte eu já iria deixar minha Marina. Sabe quando dá aquela vontade de sentar e ficar sem fazer nada? 
Caminhamos pelas ruas cheias e, guardadas as devidas proporções, eu tinha a sensação de estar na rua da Alfândega no Rio de Janeiro ou em qualquer rua de pedestres comercial.
Nosso maior sonho de consumo era o fondue desejado desde a noite anterior. Assim que compramos o essencial saímos em busca do restaurante que tínhamos encontrado por acaso no dia anterior. 
Quando chegamos lá, para nossa imensa decepção, o restaurante estava tão cheio que a moça que nos recebeu sequer nos permitiu ficar esperando lá dentro. Estava tão gostoso lá dentro e tão frio lá fora! Que inveja daquelas pessoas sentadas diante de uma panela de fondue!
Saímos e resolvemos voltar para ir ao banheiro e fazer uma última tentativa. Perguntei à moça se ela poderia me indicar outro lugar para comer fondue e ela recomendou um restaurante que ficava na outra esquina.
Para nossa imensa felicidade, o lugar - embora cheio - tinha uma mesa para nós. Encomendamos nosso fondue de queijo (não havia outras opções) que veio com pedaços de pão e vários legumes para mergulhar no queijo derretido. Bom demais! Ainda mais acompanhado de um cálice de vinho tinto.


Depois de refeição revigorante, caminhamos até a Praça Dam, passando novamente pela rua das Red Lights e pela estátua em homenagem à prostituta assassinada. O movimento numa noite de sexta-feira era intenso e eu me senti na Lapa carioca, com uma diferença: sem medo. Paramos para tirar fotos e finalmente pegamos o tram que nos levou até perto do albergue.
A noite não foi das melhores. Nossas duas companheiras de quarto já estavam deitadas e somente com uma luz de leitura. Não estavam muito a fim de conversa. Tivemos que ajeitar as malas e as coisas para dormir meio no escuro e quando finalmente me deitei não conseguia dormir com medo de perder a hora.
Meu voo saía às 9h55 e, de repente, fui assaltada pela dúvida: a que horas deveria estar no aeroporto para um voo internacional? Duas ou três horas antes? Desci para perguntar ao recepcionista do hostel e ele disse que viajava bastante para o exterior e que sempre procurava chegar com pelo menos duas horas e meia de antecedência. 
Diante disso, recombinei a hora do café-da-manhã (o hostel entregava um lanchinho para quem saía cedo) e fui deitar. Nem sei dizer que horas eram. Botamos o despertador de nossos celulares para 5h na intenção de chegar ao aeroporto Schinphol antes das 6h. 
Conseguimos acordar (é incrível como nessas horas não dá preguiça de levantar). Pegamos nossos lanchinhos, o tram para a estação central e o trem para o aeroporto.
Ainda tive tempo de fazer umas comprinhas no Free Shop (eu sabia que não teria tempo em São Paulo) e finalmente me despedi da minha Marina com o coração para lá de apertado, mas meio anestesiado pelo sono e o nervosismo da partida.
Depois de aproximadamente 15 horas de voo (contando o voo internacional em que assisti a quatro filmes e meio e o voo de São Paulo para Cuiabá), cheguei ao aeroporto de Várzea Grande por volta de uma hora da manhã de domingo.
Encontrei o caos de sempre. O motorista, um senhor simpático morador de Várzea Grande, comentou com sotaque carregado.
- Espia aí como tudo está ...
Suspirei desanimada. Dizem que é bom voltar para casa. Será?

sexta-feira, 17 de janeiro de 2014

Pelas ruas de Amsterdam e Dronten



No dia 1º de janeiro (quarta-feira) eu já estava com o coração um pouco apertado, imaginando a partida para o Brasil no sábado e a despedida de minha filha Marina. Eu procurava aplicar à vida os ensinamentos do yoga: viver aqui e agora, mas confesso que estava difícil. 
Chegamos a Amsterdam no fim da tarde e pegamos o trem para Dronten - a cidade onde Marina está estudando. Era feriado e sabíamos que não teríamos ônibus para nos levar até a casa, mas nesse dia enfrentei com valentia a caminhada de aproximadamente meia hora.
A mala era leve, tinha rodinhas e eu já estava mais habituada ao clima europeu. Mesmo assim, foi duro. 
Uma vez em casa, tomamos banho, comemos alguma coisa, lavamos roupas na máquina e fomos dormir. Como o aquecimento tinha ficado desligado durante nossa ausência, o quarto demorou a esquentar. 
Combinamos de levantar cedo no outro dia para aproveitar Amsterdam, porém perdemos o ônibus por questão de minutos e tivemos que caminhar novamente até a estação de Dronten. Pelo menos, queimamos um pouco das cervejas e guloseimas consumidas nos últimos dias.
Em Amsterdam, fomos direto à Casa de Anne Frank e encontramos uma fila quilométrica. Bem que tentamos comprar ingressos pela internet por sugestão de Carla (mulher de meu sobrinho Leonardo), mas não conseguimos para aquela data ( tivemos sucesso na compra de tickets para o Museu Van Gogh). 
Na dúvida se iríamos encarar a fila (cujo tempo de espera era calculado em duas horas) num clima frio e chuvoso, fomos ficando. A gente ficou logo atrás de uma família brasileira e acabou fazendo amizade com o grupo. O pai, a mãe e o irmão que mora na Holanda desistiram da espera e só ficou um rapaz que morava em Campinas.  Ele explicou que ia deixar Amsterdam no dia seguinte e não queria ir embora sem conhecer a Casa de Anne Frank.
Quase uma hora depois, mudou de ideia diante da informação de uma funcionária da Casa (que nos entregou alguns folhetos) de que por volta das 18h a fila ficava bem menor. Nosso amigo resolveu então partir para o Museu Van Gogh e regressar mais tarde. Espero que tenha sido exitoso em sua estratégia.
A nossa espera foi recompensada. É impossível percorrer a Casa de Anne Frank sem sair de lá comovida com a história da menina judia, cujo diário todo adolescente lê ou deveria ler. Li o livro há décadas e não me lembrava de alguns detalhes da história. 
O que mais me tocou? Sentir como deve ter sido a vida de Anne, sua família e outros judeus confinados na parte superior do estabelecimento comercial de seu pai. Perceber a sua sensibilidade e enorme talento para a escrita (ela dizia que queria ser jornalista quando crescesse e, mais tarde, escritora) e saber que por muito pouco não sobreviveu ao nazismo. Saber que morreu de tifo (assim como sua irmã) num campo de concentração pouco tempo antes dos Aliados vencerem a guerra. Saber que até hoje não se descobriu quem foi o autor da denúncia que levou a polícia nazista até o esconderijo. Ouvir os depoimentos de seu pai Otto Frank, o único sobrevivente do grupo e grande responsável pela publicação do diário e pela transformação da casa em museu (em 1960), é de cortar o coração. 
O museu traz muita informação (manuscritos de Anne, inúmeras edições de seus livros, vídeos sobre campos de concentração e depoimentos) e se torna especialmente interessante por estar instalado no cenário real - na casa onde parte daquela história aconteceu. Tanto eu como Marina saímos de lá determinadas a reler o livro "Diário de Anne Frank".
Fomos recepcionadas à saída da Casa por uma amiga brasileira, Beatriz - ex-aluna no curso de Comunicação Social da UFMT. Ela mora perto de Amsterdam há sete anos e foi nossa cicerone no restante da tarde.
Estávamos todas com fome, mas mesmo assim preferirmos ir caminhando a pé até o Centro, passando pelos canais que caracterizam Amsterdam. Almoçamos no restaurante La Place e eu estava com tanta fome que comi a minha refeição e ainda aceitei metade do sanduíche de Bea, que optou por uma sopa. Que vergonha!


Depois disso, perambulamos pelas ruas em busca de um óleo para cabelos (encomenda de uma amiga muito generosa que me emprestou o casaco, as botas e boa parte das roupas de frio que usei na viagem) e, mais tarde, tomamos cerveja enquanto botávamos a conversa em dia. Passamos por um pequeno supermercado para comprarmos algo para o nosso jantar e o café-da-manhã e seguimos pela rua das Red Lights - que na verdade não é uma rua só.
Para quem não sabe, essa "rua" é aquela das vitrines onde mulheres seminuas se oferecem a quem passa. Eu já tinha estado lá quando era adolescente durante uma excursão à Europa e confesso que fico um pouco constrangida de ver as prostitutas como se fossem animais num jardim zoológico. 
No caminho para a estação central Bea nos mostrou a estátua em homenagem a uma prostituta - provavelmente a única que existe no mundo. Contou que é uma homenagem a uma profissional do sexo  assassinada. 
Nós nos despedimos de Bea na estação e voltamos para "casa". Como já era tarde,  adivinhe o que aconteceu? Tivemos que fazer a pé o percurso até a casa de Marina. Foi estranho caminhar por ruas absurdamente desertas (só encontramos um homem passeando com cachorro que disse "Hi") numa noite fria. Mas também foi gostoso. Perguntei várias vezes à Marina se não havia perigo e ela disse que não.
Em casa, arrumamos as malas já que na noite seguinte dormiríamos em Amsterdam, mas vamos deixar esta última história para amanhã.

quinta-feira, 16 de janeiro de 2014

Entre amigos


 O trecho Dresden - Hamburgo foi o único que fizemos de ônibus já que o preço da passagem estava mais barato comparado ao do trem. 
A viagem durou aproximadamente quatro horas e, para variar, tivemos que trocar de veículo (como sempre acontecia nas trajetos de trem). Num dos trechos, sentamos em poltronas próximas a uma alemã muito estranha que chamou a atenção de Marina quando ela pegou seu celular. 
Ué, desde quando, é proibido usar celular em ônibus? - a gente se perguntou. Mas a mulher tinha um olhar de louca (além de ser bem robusta) e achamos melhor não questioná-la.
Chegamos a Hamburgo pouco depois das 18h e ficamos na dúvida se nossos amigos Johann e Martina estariam nos esperando conforme combinado, já que não conseguimos responder às inúmeras mensagens enviadas por SMS (Marina não tinha crédito para responder).
Descemos do ônibus e decidimos procurar um telefone público, mas enquanto olhávamos em volta, Marina viu um casal que passava com jeito de quem procurava alguém. O casal andava rapidamente e tivemos que correr atrás dele. Eu gritei "Johann" e o homem se virou. Ufa, eram eles.
Aqui cabe uma breve explicação sobre nossos amigos alemães.  Há quase 20 anos, quando Marina tinha pouco mais de 2 anos, Johann e Martina moraram em Cáceres (a 210 km de Cuiabá). Ela fazia sua pesquisa e tese de doutorado sobre a região para a Universidade de Tübingen, na Alemanha. Eles tinham uma filhinha, Sophia, e acabamos ficando muito amigos. A família retornou para Alemanha e, em 2012, voltamos a nos encontrar, em Cuiabá, durante uma viagem dos três ao Brasil. No segundo semestre do ano passado, entrei em contato com eles diante da minha decisão de visitar a Europa e surgiu o convite para visitá-los em Hamburgo, com oferta de hospedagem.





Johann, Martina e Sophia nos ofereceram muito mais. Eles nos convidaram para saborear uma autêntica comida portuguesa no restaurante Sagres, na noite de nossa chegada (Hamburgo tem uma grande colônia de portugueses); caminharam incansavelmente pela cidade conosco no dia 31 nos mostrando os atrativos de Hamburgo e nos ofereceram uma festa de Réveillon num centro cultural, com direito à ceia e a vários ambientes de dança. Serei eternamente grata a eles.
Ainda fizeram questão de nos levar à estação de trem de onde partiríamos para Amsterdam às 9h do dia 1º.  Tudo isso, entrando e saindo do metrô, e caminhando sob o ar gelado de Hamburgo.
Visitamos o "Porto Maravilha" (o nome é uma brincadeira de Martina com o projeto de revitalização do Porto do Rio de Janeiro),
comemos waffle com calda de uma frutinha vermelha e sorvete num café lotado de gente, e subimos na torre da Catedral Saint Michel, no cair da noite (132 metros de altura - quase congelei meus dedos para tirar fotos, mas a qualidade não ficou boa porque já estava escuro).


















Mais do que isso, desfrutamos da hospitalidade da família. 
Um detalhe, Sophia, hoje com 19 anos  e estudante universitária, adora o Brasil e passou seis meses em nosso país no primeiro semestre do ano passado. Na noite do Réveillon, ela não ficou com a gente porque teve que trabalhar (num café).
Os três falam e entendem português, e eu estou louca para ter a oportunidade de retribuir um pouco de sua gentileza numa próxima vinda da família ao nosso país.
Ah, Hamburgo é uma cidade muito bonita e, se estivesse menos frio, teria aceito o convite de Martina e Johann para fazermos um passeio de barco. Quem sabe num próximo encontro?



quarta-feira, 15 de janeiro de 2014

Domingo em Dresden


Dresden entrou no nosso roteiro por sugestão de Maria Teresa, minha sobrinha que mora no Sul da Alemanha. Como a cidade ficava no meio do caminho entre Praga e Hamburgo (na Alemanha), decidimos passar por Dresden, onde chegamos ao final de uma manhã de domingo. 
Logo que descemos do trem, confesso que fiquei meio decepcionada: a cidade parecia normal demais depois de nossa passagem por Praga.  Nosso hostel ficava a duas ou três quadras da estação de trem e, depois de um pequeno estresse para descobrir o nome dele num domingo em que tudo parecia fechado (não lembrávamos do nome e tivemos que procurar uma lan house para olhar os emails da Marina), chegamos ao A&O Hostel. Foi minha primeira experiência em um hostel. 
Como só podíamos entrar no quarto depois das 14h, deixamos as malas numa espécie de depósito e fomos passear. Perguntamos onde era a parte mais antiga e turística da cidade e tomamos nosso rumo. Andamos muito e a cidade continuava parecendo absolutamente normal. Meus pés doíam depois de tantos dias enclausurados, mas continuamos andando na direção indicada. 
De repente, Marina grita entusiasmada: ela tinha avistado o restaurante Vapiano, que conhecia de Amsterdam e no qual pretendia me levar na minha chegada à Holanda. Combinamos que pararíamos ali na volta para comer.
Depois de mais alguns minutos de caminhada, encontramos uma barraquinha de vinho quente e aí fui eu que fiquei muito feliz. Consegui me esquentar um pouco e ganhar alento para seguir em frente. 
Finalmente chegamos ao nosso destino e, aos poucos, fomos ficando deslumbradas. 



Dresden tem uma história rica como capital da Saxônia, porém foi intensamente bombardeada na 2ª Guerra Mundial, quando cerca de 35 mil pessoas morreram. A cidade pertenceu à parte oriental da Alemanha até a reunificação do país em 1989, com a queda do Muro de Berlin.
Dresden recuperou os principais tesouros arquitetônicos destruídos pelos ataques aéreos dos aliados (veja mais em http://viagem.uol.com.br/noticias/viagens-36-horas/2012/08/31/conheca-a-cidade-de-dresden-na-alemanha.htm) e hoje se divide entre a Altstadt (Cidade Velha) e a Neustadt (Cidade Nova).
Era essa a história que me interessava.
Depois de percorrermos boa parte da Altstadt e nos encantarmos com a beleza do rio Elba, não resistimos a atravessar uma ponte e caminharmos mais um pouco por um boulevard belíssimo.


Mas queríamos regressar antes que a noite caísse. No trajeto até o restaurante Vapiano, esbarramos em vários artistas de rua e nos misturamos à multidão que passeava num final de tarde de domingo em Dresden.
Chegamos ao restaurante famintas e exaustas, e o prato de massas com um cálice de vinho caiu como luva. Depois disso, caminhamos mais um pouco até chegar ao hostel. 
Finalmente conhecemos nossos companheiros de quarto. Num primeiro momento, levei um susto: tinha um casal dormindo e o lugar que nos sobrava era um beliche num canto. Passado o susto inicial, percebemos que o quarto era bem legal (tinha banheiro completo) e o "casal" era um amor: dois irmãos mexicanos (uma universitária de 19 anos, estudante de Arquitetura na Europa, e um adolescente de 16 anos). 
Conversamos um pouco e, apesar do cansaço, Marina e eu decidimos enfrentar a noite de Dresden. Não dava para ficar no hostel num domingo à noite! 
Depois de pegarmos informações com o recepcionista do hostel, tomamos um trem (na verdade, uma espécie de metrô de superfície) em direção à Neustadt. Não era exatamente um Baixo Leblon (Rio de Janeiro) ou uma Praça Popular (Cuiabá), mas percorremos algumas ruas em busca de um bar onde não houvesse tanto cheiro de cigarro. Foi difícil. Acabamos tomando cerveja numa casa de chá bem aconchegante. Em seguida, resolvemos comer um Kebab numa lanchonete.
O garçon não falava inglês e disse que ninguém falava inglês no local. Por sorte, ele pediu ajuda a um freguês (o segundo homem mais lindo que vi na viagem) que nos ajudou a escolher nossos kebabs - uma especialidade turca muito apreciada em países com forte imigração turca, como é o caso da Alemanha. É gostoso demais!
Os nossos kebabs eram imensos e guardamos metade para comer no dia seguinte, como café-da-manhã antes de seguirmos viagem para Hamburgo.
Na volta do passeio noturno pegamos o trem de novo e acabamos conhecendo um rapaz canadense quando procurávamos por alguém que nos ajudasse a localizar o ponto em que deveríamos descer. Tudo parecia tão escuro e igual! Ele disse que estava indo para o hostel e se ofereceu como guia. Mais uma vez, ficamos um pouco ressabiadas, mas deu certo e chegamos sãs, salvas e exaustas ao hostel. Valeu conhecer Dresden!



terça-feira, 14 de janeiro de 2014

Praga é uma festa! (parte final)

Hoje encerro - com pesar -  minha visita virtual a Praga. No nosso segundo dia de passeios pela capital da República Tcheca visitamos o Museu de Franz Kafka e, para chegar até ele, atravessamos mais uma vez a Charles Bridge. 
Nossos passeios eram sujeitos a improvisos (como é bom isso!) e quando vimos alguns turistas entrando por uma portinha seguimos atrás. Era o acesso para subir na torre da ponte. Gastamos algumas coroas tchecas no passeio, mas valeu a pena. De lá, tivemos uma bela visão de Praga, mesmo que o dia estivesse um pouco nublado.


A Ponte Carlos é outra referência de Praga. É a mais antiga da capital e a segunda mais antiga da República Tcheca. Sua construção sobre o rio Moldava (ou Vitava) começou em 1357, sob os auspícios do rei Charles IV, e terminou no início do século XV. Fiquei imaginando que loucura deve ter sido construir uma ponte daquela envergadura no final da Idade Média. 
Hoje a ponte é palco de um verdadeiro footing, com a passagem ininterrupta de turistas, que param para admirar a paisagem, as estátuas, as quinquilharias e souvenirs vendidos nas barracas ao longo da Charles Bridge, e os músicos que disputam espaço em troca de seu ganha-pão.


O Museu de Franz Kafka fica junto ao rio, do outro lado da ponte, para quem sai de Old Town. É um museu contemporâneo, interativo e bem estruturado, com fotos, vídeos e naturalmente muita informação sobre o mais célebre escritor tcheco. Conheci a obra de Kafka na adolescência e fiquei muito impressionada com a leitura de "O Processo" e "Metamorfose", mas não me lembrava de muita coisa sobre sua vida. O escritor é uma daquelas personalidades angustiadas desde a infância (pai e sociedade opressoras) e me impressionou bastante saber a comoção provocada pela leitura em público de um de suas obras mais perturbadoras, "A Colônia Penal", em que descreve com detalhes um aparelho criado para a tortura de presos.
Depois de mergulhar no universo kafkaniano por aproximadamente uma hora, confesso que cansei por alguns instantes. Meus pés doíam muito dentro das botas e me sentei por alguns minutos às margens do rio Moldava para ver se conseguia acomodá-los melhor. Enquanto isso, admirei a paisagem.



Depois disso retornamos a Old Town pela nossa já querida Charles Bridge e nos dedicamos à compra de alguns souvenirs, após um sanduíche e um sorvete de casquinha. Logo escureceu. A gente se despediu do relógio astronômico e fomos atrás de um bar indicado por um amigo de Marina: o Vytopna Railway, onde as bebidas são servidas num trenzinho. Como não tínhamos feito reservas, conseguimos uma mesa bem no fundo (junto aos toilettes) e ficamos apenas o tempo necessário para conhecer o lugar e tomar nossas cervejas. 



A moça do hotel tinha nos dito que o Deminka, o restaurante visitado na primeira noite por acaso, tinha boa música ao vivo e, embaladas pelas boas lembranças do local, resolvemos voltar lá. Não tinha música, mas acabamos ficando para mais uma cerveja.
Sabe o que mais curti em Praga? O prazer de me misturar às pessoas - turistas ou não - e de poder caminhar tanto pelas ruas sem medo (embora tenha sido advertida para tomar cuidado com a bolsa) e sem morrer de calor.
Curti demais também a música de Praga, seja ela feita nas ruas por artistas anônimos (como um cantor maravilhoso que estava se apresentando à noite junto à árvore de Natal em Old Town),  ou feita nos bares e restaurantes, nas igrejas e salas de concerto. 
Ah como gostaria de ter mais tempo para desfrutar de toda essa música! Sinceramente, tenho me sentindo bem deslocada diante da maior parte da música produzida e ouvida em nosso país.




segunda-feira, 13 de janeiro de 2014

Praga é uma festa! (Parte 2)



Depois de um final de semana bem intenso em meio às comemorações da formatura de uma amiga de infância de minhas filhas, retomo meu diário de viagem exatamente em Praga.
A capital da antiga Tchecoslováquia (a separação entre a República Tcheca e a Eslováquia aconteceu em 1992), também conhecida como a Pérola do Oriente, é uma cidade bem receptiva a turistas e fica evidente o quanto gosta (ou precisa) deles. 
Acredito que o turismo seja uma das principais fontes de renda da cidade. Não tivemos dificuldades para encontrar pessoas que falassem inglês e, em algumas lojas de souvenirs  (são inúmeras!), alguns vendedores até arriscam o portunhol. 
Numa delas, eu perguntei ao moço que nos atendia se era árabe e ele respondeu: "Não, turco. Veja: big eyes, big nose, big mouth ..." Parecia o encontro da Chapeuzinho Vermelho com o Lobo Mau.
Em pouco mais de dois dias de Praga, naturalmente não pudemos conhecer toda a cidade. No primeiro dia, a gente se dirigiu a Old Town - o centro histórico da cidade, que tem como uma de suas referências o magnífico relógio astronômico. É ali que se concentram os guias de turismo de diversas empresas que promovem o chamado "free tour". Na verdade, você paga quanto quiser ao final de um tour de quase duas horas.
Como adoramos o passeio guiado por nossa guia Cristina, demos o valor sugerido por ela (o equivalente a 5 euros por pessoa). Nosso grupo era formado por pessoas de vários países (malaios, norte-americanos, europeus) e as explicações eram dadas em inglês. Nossa guia era muito divertida e sempre finalizava suas explanações com algum comentário engraçadinho ...
"And so, let's go" - dizia, empunhado sua sombrinha fechada, como uma Mary Poppins moderna.

Cristina, a guia

Depois de percorrermos os prédios e vias mais importantes da chamada Old Town e de seu entorno, Marina e eu nos sentimos suficientemente valentes para encarar outros passeios sozinhas, munidas do mapa da cidade. 
Comemos um big crepe (mais bonito que gostoso) numa das barracas do Christmas Market por volta de 14h e resolvemos visitar o Castelo de Praga, que fica no alto, do outro lado do rio Moldava (ou Vitava). O passeio foi lindo, mas tenho certeza de que não dedicamos ao local tempo suficiente. Estávamos cansadas das andanças da manhã, mas não queríamos desperdiçar a beleza do dia (um céu azul, sem nuvens). Além disso, havia gente demais no castelo  - um conjunto de várias edificações, onde a cidade se iniciou no século IX. 
Resolvemos descer a pé (na subida, fomos num ônibus elétrico tão cheio de turistas que nem conseguimos descobrir como fazíamos para pagar a passagem). Foi uma decisão sábia ... A descida por uma escadaria foi linda e antes pedimos para um rapaz de um grupo animado para que tirasse uma foto de nós duas na entrada principal do castelo. Advinhe de onde ele era: de Cuiabá (MT). Eu me arrependi muito de não ter tirado uma foto com ele. Nosso amigo mato-grossense foi mais um dos inúmeros jovens que encontramos do programa Ciência sem Fronteiras.

A foto tirada pelo colega cuiabano em frente ao Castelo de Praga

No retorno à Old Town, passamos pela Catedral de São Salvador e não resisti à possibilidade de assistir a um concerto em seu interior. Como a apresentação já tinha começado, o responsável pela venda dos ingressos fez um preço camarada. A igreja estava bastante cheia e fiquei frustrada de ficarmos de costas para os músicos: uma soprano, que ora se apresentava acompanhado do órgão, ora de instrumentos de cordas. Mesmo assim foi lindo e confesso que fiquei com olhos cheios de lágrimas em alguns momentos.
Depois de tanto andar, estávamos morrendo de fome e, após alguma hesitação, entramos num restaurante perto da Old Town, Müstek, onde mergulhei com vontade num prato de Goulash - um guisado de carne de vaca, bem suculento e cheio de calorias, devidamente acompanhado do tal dumpling (uma espécie de bolinho ou pão muito gostoso).
Depois de uma refeição dessas, não dava para ir dormir, por isso fomos atrás de um bar sugerido por um colega da Marina, onde poderíamos experimentar vários tipos de cerveja. Andamos bastante, perguntamos e conseguimos chegar ao tal bar, porém além de muito cheio, o cheiro de cigarro estava insuportável e não eram aceitos cartões de crédito (estávamos sem coroas tchecas naquele momento).
Acabamos parando em outro bar, um Irish bar, onde tomamos um canecão de cerveja e ouvimos música ao vivo da melhor qualidade: dois violonistas sessentões tocando e cantando sucessos dos Beatles, Bob Dylan e Simon & Garfunkel, entre outros.
De lá, voltamos para o hotel - uma caminhada longa e gostosa. No caminho, passamos mais uma vez pela Old Town e pelo relógio astronômico. Era tarde, estava frio, mas Praga continuava efervescente.

A bela vista do Castelo de Praga

Antes de terminar, uma nota triste: uma coisa que chamou minha atenção em Praga foram os mendigos. Fiquei grilada de tirar foto, mas eles ficavam deitados sobre os joelhos, com a cabeça baixa (olhos voltados para o chão) e deixam um chapéu ou algo parecido para recolher as moedas. Pareciam estátuas de tão imóveis. Fiquei imaginando quem são essas pessoas e uma amiga europeia me disse que contam que são pessoas exploradas por uma espécie de Máfia que os atrai às cidades com falsas promessas e tiram seus passaportes, assim como qualquer possibilidade de sair daquela vida.
Não sei se é verdade, mas não deixa de ser triste ver aquelas pessoas numa posição tão humilhante em meio a tanta alegria das pessoas que passam rindo, conversando e se empanturrando de tanta comida boa. 


 

sexta-feira, 10 de janeiro de 2014

Praga é uma festa!



O escritor norte-americano Ernest Hemmingway cunhou a frase "Paris é uma festa". Pois eu me lembrei várias vezes dessa frase nos dois dias e três noites passados em Praga.
E pensar que quase desisti da ideia inicial de conhecer a capital da República Tcheca! Estava com medo do frio, mas depois de pesquisar na internet e ouvir os conselhos de alguns amigos (como minha sobrinha Luciana), resolvi deixar o medo de lado. Ainda bem!
Não sei se tivemos sorte, mas o frio estava totalmente suportável e não pegamos chuva. Chegamos a Praga à noite, como relatei num post anterior, e, como estávamos morrendo de fome, deixamos as malas no quarto do hotel e fomos em busca de um restaurante sugerido pela recepcionista.
Não o encontramos, mas entramos em outro (Deminka) por sugestão de um rapaz que abordamos no caminho. Ao contrário do meu comportamento habitual, resolvi me arriscar numa receita da casa e pedi: Roast sirloin with cream sauce according to an old Czech recipe (http://www.yelp.com/biz/dem%C3%ADnka-prague).
Marina pediu uma massa: Gnochi with bryndza cheese and crispy bacon. Pedimos ainda duas canecas de boa cerveja tcheca.
Pensem numa comida maravilhosa que caiu como uma luva depois de um dia à base de barrinhas de cereais. 

Marina tirando casquinha do meu prato

Nessa noite eu me apaixonei por um tal de dumpling - que é uma espécie de pão (ou torta ou bolinho) que acompanha a comida, ou seja, um verdadeiro pesadelo para quem não quer engordar. Como se não bastasse, dividimos uma apple strudel de sobremesa - um folheado de maçã que é sinônimo para mim de prazer desde a época em que frequentava o Restaurante Alpino em Teresópolis há quase 30 anos.
Nesse dia, anotei o preço da refeição: 466 coroas tchecas, o equivalente a pouco mais de 17 euros, ou cerca de 60 reais.
Nem preciso falar que essa história de conversão de moeda me deixou doidinha em Praga (1 coroa tcheca vale cerca de 0,27 de euro), o que acabou me levando a gastar mais do que pretendia.
No final, eu usava o preço de um copo de vinho quente nas barraquinhas da rua como referência para todas as outras contas. Tipo, com esse dinheiro poderia beber tantos copos de vinho quente.
Não sei se sempre tem vinho quente na rua (como estávamos perto do Natal, encontramos um Christmas Market na praça central da Old Town), mas é uma delícia bebê-lo naquele frio. É doce e meio enjoativo no final, porém tem sabor de festa junina e deixa a gente bem alegre e quentinha.
Tenho muito a contar sobre Praga e se continuar detalhando tanto vou passar dias escrevendo sobre a cidade. 
Pena que Praga seja tão longe de Cuiabá! 


Uma vista da famosa Charles Bridge

 

quinta-feira, 9 de janeiro de 2014

Natal na Floresta Negra

 
Marina, Carla, Leonardo e Pilar em Villigen-Schwenningen

Fiel à cronologia da viagem, hoje vou falar sobre o Natal, que passamos -  minha filha Marina e eu - no Sul da Alemanha, mais precisamente na região da Floresta Negra.
Chegamos à estação de Saint George no dia 24, por volta de 7h, e tivemos a alegria de sermos recebidas com um abraço e o sorriso aberto de minha sobrinha Maria Teresa (Tetê), que mora em Mönchweiler há quatro anos. 
A casa dela, construída pelo marido Christian, é linda. Parece aquelas casas de filmes norte-americanos ou europeus modernas, práticas e, ao mesmo tempo, aconchegantes. 
Depois de algumas horas de sono para compensar a noite mal dormida durante a viagem de trem, reencontramos o resto da família numa mesa farta de café da manhã: os três filhos mais velhos de Tetê, que também estavam visitando a mãe, genro, nora e a netinha Maitê - menos de dois anos de pura gostosura.
Em seguida, todos - com exceção do casal anfitrião - fomos passear em Villigen-Schwennigen, uma cidade um pouco maior, situada a cerca de 15 minutos de carro. 
Fizemos um lindo passeio a pé na parte antiga da cidade, cercada por um muro, e lá, meu sobrinho Leonardo contou que havia grande rivalidade entre os moradores de Villigen e de Schwenningen num passado remoto. Eles viviam brigando e, numa certa época, os governantes da segunda (ou foi da primeira?) fizeram um cerco para matar seus rivais de fome. Os sitiados tiveram então a ideia de soltar os poucos bichos que tinham e fazer uma algazarra bem grande para parecer que havia muitos víveres ainda na cidade. Diante disso, os inimigos desistiram do cerco. 
Não sei se a história é exatamente essa e se é verdadeira, mas hoje os vilarejos estão ligados e, aparentemente, em harmonia.
Passeando pelas ruas, descobrimos que as lojas fechavam às 14h na véspera de Natal - fato totalmente inusitado para nós, brasileiros, habituados ao comércio aberto até o último minuto (pobres comerciários!).
Depois de um lanche no Burger King, passeamos pela região do Lago Titisee. Um passeio belíssimo, que deu um gostinho ainda melhor do que nos esperava na Europa em termos de deslumbramento.
Chegamos em casa pouco antes do início da ceia. A comida deliciosa foi preparada pelo anfitrião: pato, uma batata gostosíssima e salada de cenouras e ervilhas. A sobremesa, uma torta maravilhosa, foi feita pela anfitriã. 
Depois da chegada de Papai Noel,  ficamos ali curtindo a casa quentinha e a alegria de Maitê.  Eu estava um pouco preocupada com minha outra filha, Diana, que viajou para o Estado de São Paulo de ônibus na véspera do Natal e ainda não tinha dado notícias.  Coração de mãe é fogo: está sempre dividido ...
No dia seguinte, depois de mais um café da manhã gostoso fomos visitar o apartamento de Mercedes, minha sobrinha neta que também mora na Alemanha, numa outra cidade relativamente próxima. Fomos e voltamos debaixo de chuva forte, mas isso não impediu que desfrutássemos do aconchego do apê de Mercedes e Mathias e da linda vista do Lago Constance - o maior da Europa.
O jantar aconteceu num restaurante muito especial que funciona numa antiga estrebaria. Comi vários pedaços de uma pizza diferente, que é a especialidade da casa, e tomei cerveja de trigo (Weissbeer). 
No dia seguinte, cedo, seguimos nosso caminho para Praga, depois de vermos Monchweiler e a estrada que nos levou à estação de Villingen-Schwenningen tomada pela neve que caiu durante à noite. Pena que ela não caiu no dia anterior para realizar meu sonho de um Natal dos cartões de Natal da minha infância, com neve e bonecos de neve.  Mas deixamos o Sul da Alemanha nos sentindo ainda mais próximos desse ramo da nossa imensa família Baptista, agora acrescida de alguns sobrenomes alemães.

O requinte da ceia de nossos anfitriões
Prost!



quarta-feira, 8 de janeiro de 2014

Encontros e despedidas


Minha sobrinha Tetê se despede de nós na estação de Villingen-Schwenningen, na Alemanha, sob chuva e neve
Minha viagem à Europa foi um resgate da minha relação com trens. Quando planejamos o roteiro (minha filha Marina e eu), dei força para fazermos a maior parte dos trajetos de trem. Em parte porque sou meio apaixonada por viagens de trem; em parte, porque achava que seria mais seguro andar sobre os trilhos do que voar debaixo de uma neve que imaginei caindo do céu sem parar. 
Não me arrependi de nossa decisão (baseada em preços e não nos meus gostos ou medos pessoais), porém tomei um verdadeiro chá de cadeira de trem. Não sei dizer quantos quilômetros percorremos de trem, mas posso dizer que fomos de Amsterdam a Dronten (a pequena cidade onde Marina mora na Holanda), de Dronten a Saint George (na Alemanha); depois para Praga; em seguida, voltamos para Alemanha por Dresden, e retomamos as viagens de trem depois de um breve trecho de ônibus entre Dresden e Hamburgo na Alemanha.
As estações centrais são impressionantes e parecem cenários de filme, mas os trens estão longe de ter o glamour do Orient Express. As poltronas nem sempre são confortáveis e, tampouco, os banheiros são modelo de limpeza. Diria que as viagens de trem pela Europa me lembraram mais as saudosas viagens nos trens da Noroeste do Brasil, que ligavam o Estado de São Paulo à minha cidade natal, Corumbá (MS).
Exageros à parte, vivemos algumas situações divertidas e/ou tensas (dependendo do ponto de vista) nos trens europeus. 
Viajamos uma noite inteira de Dronten, na Holanda, ao Sul da Alemanha e tivemos que trocar de trem umas quatro ou cinco vezes. Ou seja, impossível dormir com medo de perder a hora de trocar de trem.
Numa dessas trocas, minha filha perguntava ao funcionário da empresa Deutsche Bahn (DB) se aquele trem estava indo na direção que queríamos e ele gritava de volta algo mais ou menos assim em inglês:
- Se você vai pegar esse trem entre imediatamente!
Minha filha me surpreendeu enfrentando o alemão em alto e bom som:
- Preciso saber se ele vai para tal estação!
Confirmada a informação, subimos de forma atrapalhada arrastando malas e mochilas por corredores estreitos em busca de nosso vagão. 
Em outro trecho - entre Praga e Dresden, acredito - nosso lugares eram numa cabine que já parecia lotada quando entramos. Dois casais norte-americanos de uma mesma família tinham usado todo espaço para guardar suas malas imensas. Sorte que eles eram simpáticos e encontraram um lugarzinho para colocar nossas malinhas.  Eles até nos ajudaram a colocá-las no bagageiro.
Mas o episódio mais interessante da nossa viagem sobre trilhos aconteceu no trecho entre o Sul da Alemanha, onde passamos o Natal, e Praga. Depois de uma dessas trocas de trem, entramos num trem com cabines onde não tínhamos lugar reservado. Nas primeiras cabines vi cachorros enormes acomodados no piso e não gostei da ideia de viajar algumas horas com eles. 
Finalmente encontramos uma cabine onde só havia um homem - o mais lindo que vi durante toda nossa viagem. Ele era tcheco, falava inglês e confirmou que o trem seguia para Praga - seu destino final.
Diante da presença de minha filha, controlei minha vontade de tagarelar com o desconhecido. Horas depois, o trem aparentemente chegou a Praga e ele se encaminhou para a saída. Nós duas imediatamente nos preparamos para descer, colocando casacos, luvas e pegando as malas. Nem nos demos conta de que outros passageiros não desceram junto, como seria natural.
Uma vez na plataforma da estação, descobrimos que ali não era a estação central. E nosso trem já estava indo embora. 
Por sorte, nosso belo tcheco devia ser um leitor de Saint Exupéry na infância - "Tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas" - e se apiedou de nós. Ele nos explicou que ali não era a estação central, porém era uma estação também boa para nós. O desconhecido se ofereceu para nos ajudar e nós, sem outra opção, o seguimos cegamente - com uma pontinha de medo, confesso.
Ele carregou minha mala nas escadas (nem sempre as estações contam com escadas rolantes) e entrou conosco no metrô. Dentro do vagão nos explicou em que estação deveríamos descer e para onde seguir.  Logo depois, desceu.
Fizemos o que ele mandou e quando saímos da estação do metrô, encontramos outro anjo que nos ajudou a localizar a posição exata do hotel com a ajuda da internet de seu celular. Ele também nos acompanhou até a rua e se ofereceu para carregar minha mala. 
O Hotel Musketyr ficava do outro lado da rua. Que alívio! 


Marina em um dos inúmeros trens de nossa viagem

terça-feira, 7 de janeiro de 2014

A carona que caiu do céu

De volta à infância
 Minha segunda aventura na Holanda aconteceu logo após o incidente no aeroporto Schiphol.
Como chovia bastante em Amsterdam, desistimos - Marina e eu - de nossos planos iniciais de almoçar no restaurante Vapiano na capital e, depois de um rápido almoço no Burger King dentro da estação central, pegamos o trem para Dronten, a cidade onde ela está morando desde o final de agosto.
Para mim, apesar do cansaço e do susto no aeroporto, tudo era novidade e alegria pelo reencontro com Marina.
Quando chegamos a Dronten, depois de pouco mais de uma hora de viagem de trem, veio o segundo susto. Como era domingo, não havia ônibus, nem táxi para nos levar até a casa da Marina, situada perto da universidade CAH Vilentum.
Eu estava exausta da viagem (tinha saído de Cuiabá por volta de 7h da manhã do dia anterior) e nem um pouco habituada ao clima europeu. Estava muito frio e ventava muito - um vento gelado. Fechei o casaco o máximo que pude e coloquei o capuz para proteger a cabeça e, principalmente, as orelhas. 
Tínhamos que puxar duas malas de rodinha e Marina ainda levava sua bicicleta que tinha sido deixada no estacionamento junto à estação.
Procurei saber quanto tempo levaria nossa caminhada.
"É longe" - respondeu Marina.
Eu não imaginava quão longe seria, mas tive a oportunidade de fazer esse mesmo trajeto outras três vezes durante a minha estadia em Dronten e posso assegurar que levou uns 35 minutos.
Nesse dia, por sorte, não cheguei a completar o trajeto a pé. Ainda bem, porque acho que não conseguiria ou, na melhor das hipóteses, ficaria com muita dor nas mãos pelo esforço de puxar a mala. 
Quando ainda nem tínhamos chegado à metade do caminho, vimos um carro parado e Marina resolveu pedir uma informação ao motorista sobre um possível atalho. Enquanto ela falava com o motorista, fiquei rezando por uma carona, embora minha filha tivesse me dito que caronas eram praticamente impossíveis em Dronten.
Pois o cara ofereceu a carona e nós aceitamos. Loucas? Talvez, mas foi uma questão de sobrevivência.
O motorista era marroquino e morava em Dronten há algum tempo. Ele nos levou até a casa da Marina e ainda se ofereceu para levá-la de volta para pegar a bicicleta que ficou lá, no ponto onde entramos no carro.
Marina ficou meio na dúvida sobre voltar sozinha com o rapaz, mas como ele disse conhecer um de seus colegas de curso ela aceitou a oferta. 
Fui me ambientando com a casa enquanto a esperava, naturalmente preocupada.
Ela chegou uns 15, 20 minutos depois e pude tomar um bom banho, jantar e ainda tomar um cálice do vinho deixado de presente por um de seus colegas de casa. Acho que foi o melhor vinho que tomei na minha vida ...
No dia seguinte, depois de uma ótima noite de sono, fomos ao Centro de Dronten para comprar coisas para o almoço. Um colega do Ciência sem Fronteiras da Marina emprestou sua bicicleta para mim e tive o prazer de me sentir uma "Dutch" por algumas horas. Aproveitamos a ida ao Centro também para comprarmos algumas lembranças (comestíveis) para a família que encontraríamos em Mönchweiler (Alemanha) no dia seguinte... 
 Mas isso fica para o próximo capítulo.

Supermercado em Dronten

segunda-feira, 6 de janeiro de 2014

"Ai se eu te pego"

Em frente ao Castelo de Praga, 27 de dezembro de 2013

Há poucos dias estava de malas prontas para a partida; hoje, já estou de malas desfeitas.
Foram 15 dias de viagem e provavelmente vou precisar de alguns posts para tentar registrar (para mim e quem mais quiser ler) minhas aventuras e impressões de meu pequeno e breve tour pela Europa. Espero conseguir fazer isso antes que a memória me traia.
A viagem foi maravilhosa e meu único arrependimento foi não ter marcado minha volta para domingo (dia 5) para ganhar mais um dia ao lado de minha filha Marina. 
Em linhas gerais, posso dizer que: 1- Não morri de frio. 2-Fiquei comovida com o carinho dos amigos que nos receberam. 3- Amei Praga. 4- Sou muito grata por essa oportunidade que tive de voltar à Europa.
Foram muitos dias de deslumbramento e de alegria de sentir novos cheiros, provar novos sabores, ver novos rostos e me sentir numa Babel em meio a sotaques, costumes e rostos tão diferentes.
De repente, estou no Castelo de Praga, peço para um rapaz tirar uma foto e descubro que é mais um estudante do Programa Ciência sem Fronteiras e é simplesmente de Cuiabá, a cidade onde moro. 
Ou estou em Dresden, na Alemanha, absolutamente fascinada pela luz do entardecer do outro lado do rio Elba, e uma russa me pede para tirar uma foto dela, retribuindo a gentileza, em seguida.
Foram muitos encontros, alguns bem pontuais, mas fundamentais para que chegássemos aos nossos destinos sãs e salvas. 
E pensar que essa viagem começou meio mal, já que fui detida na Imigração quando chegava ao aeroporto Schiphol, em Amsterdam. 
O funcionário da Imigração me perguntou em que hotel ia me hospedar na cidade e, diante de minha resposta de que ficaria com minha filha, quis ver o ticket da passagem de volta, que eu não tinha, embora estivesse comprada.  
Resultado: fui levada para uma sala onde já estavam outras pessoas recém chegadas no mesmo voo e tivemos que aguardar que todos os demais passageiros da fila passassem pela imigração para termos nossos destinos decididos.
Tenso. A moça ao meu lado perguntou se eu tinha uma carta da minha filha dizendo que ia me hospedar na casa dela. Ela tinha uma carta dos parentes e eu sequer tinha essa carta.
Mas, finalmente, chegou minha vez de ser ... interrogada e tudo se resolveu a contento. O funcionário gentilmente me fez várias perguntas sobre o motivo da viagem, a situação da minha filha, perguntou quanto dinheiro tinha trazido e pediu para ligar para minha filha. Ainda bem que ela atendeu imediatamente. Ele lhe perguntou sobre tudo que eu tinha dito e se ela queria falar comigo. Enquanto falávamos, ele carimbou meu passaporte. 
Ao seu lado, outro funcionário da Imigração se divertia cantando "Ai seu te pego..." - o sucesso internacional do brasileiro Michel Teló. Argh ...
Na saída, vi que uma das moças detidas comigo chorava  Ela veio ao encontro do namorado, mas ele ainda não tinha atendido a ligação do policial. Abracei-a e fui me embora correndo depois de lhe desejar boa sorte. Peguei minha mala na esteira e corri ao encontro de minha filha.
Fim do primeiro capítulo.  

Dresden,  29 de dezembro de 2013