quarta-feira, 27 de março de 2013

Fortaleza


Foto tirada no início dos anos 1960 na praia do Leme (acredito). July está no centro de maiô preto, entre Junilza (à esq.) e Jandira. Delcídio aparece atrás e o outro homem é Manoel, marido de Jandira. As crianças são (da esq. para dir.): Martha, Tadeu, Laura, Fátima e Dione. Del e Júlio ainda não tinham nascido. A foto foi feita por César (marido de Junilza) e digitalizada por Augusto César (filho do casal).  Ela não é maravilhosa?
 Será que posso falar neste espaço sobre a dor de perder uma irmã?
Mesmo que você quase não veja ou fale com aquela irmã, é tão bom saber que ela está ali e que você pode contatá-la com um simples telefonema!
Desde ontem (26/03), não posso mais ligar para July.
Faz muito tempo que a morte não visita nossa familia (ainda bem) e a gente fica com aquela ilusão de que todos viveremos para sempre. E com isso se esquece de aproveitar cada fim de semana, cada momento para dizer a cada irmã, cunhado ou sobrinho quanto eles são especiais.
Sou filha de uma família maravilhosa: amorosa, acolhedora, não raro controladora... Na qualidade de caçula de oito irmãos tive o "privilégio" de ser meio irmã/meio filha de quase todos.
Com July não foi diferente. Na minha infância, sua participação não foi muito notável. Eu morava no Rio e ela em Corumbá. Eu me lembro de ter ido uma vez a Corumbá quando pequena e ter visitado a casa de July na rua Tiradentes, em frente a uma praça imensa. De vez em quando, July, seu marido Delcídio e seus filhos nos visitavam no Rio e a casa da minha mãe ficava lotada de malas, adultos e crianças ...
Quando eu tinha uns 11 anos, July, Delcídio e seus seis filhos se mudaram para Barra Mansa, a pouco mais de 100 km da cidade do Rio de Janeiro. Foi aí que passamos a ter um relacionamento mais intenso. Eu passei muitos finais de semana em Barra Mansa, brincando com meus sobrinhos e seus amigos. Como era gostoso! A gente se aventurava pelo morro que ficava atrás da casa do bairro Estamparia e se divertia muito.
Nas férias, a família ia para alguma praia próxima e lá ia eu de contrapeso - a tia que era pouca coisa mais nova do que a filha mais velha do casal, Fafá.
Fomos para Guarapari mais de uma vez, Cabo Frio, Ubatuba ... Às vezes ficávamos em hotel (a turma toda), mas houve ocasiões em que ficamos numa casa alugada. A temporada em Ubatuba foi maravilhosa! Eu estava com 15 anos e me lembro de curtir muita praia e as paqueras. Na despreocupação dos meus 15 anos, eu não me lembro como July fazia para organizar aquela casa com tanta gente!
Quando eu tinha 19 anos, fizemos uma viagem ao Sul, começando por Foz de Iguaçu e indo até o Rio Grande do Sul. Fomos em dois carros: um deles era dirigido por July e Delcídio e o outro por mim e Fafá. Mamãe também participou dessa viagem e, se não me falha a memória, viajava quase sempre no nosso carro. Foi muito gostoso! Acontecia de nos perdermos na estrada e ficarmos agoniados até nos reencontramos num tempo em que ninguém sonhava com a facilidade de um telefone celular. Em Gramado (segundo minha sobrinha Luciana, que tinha uns 7 ou 8 anos na época), a família Amaral, mamãe e eu nos encontramos com a família Silveira (Jandira, Manoel e Lu).
Aos poucos, fui ficando mais independente e comecei a viajar por minha própria conta, me desligando um pouco da família Amaral, mas os laços afetivos ficaram para sempre e eram renovados anualmente nos Natais passados em Barra Mansa (na bela casa do Verbo Divino) ...
Eu me mudei para Mato Grosso em 1988, mas continuei voltando sempre que podia. Nesses encontros tão movimentados e cheios de gente, eu talvez nunca tenha me dedicado o suficiente àquela irmã que definitivamente parecia mais minha mãe e que parecia tão forte.
Quando falávamos por telefone, geralmente eram conversas longas, sobre pessoas e fatos da família. Muitas vezes ela me falava de sua fé inquebrantável e, de uma maneira sutil, tentava me "catequisar".
Não me converti e nem lhe dei a alegria de frequentar a Igreja Católica como ela, mas sempre guardarei com muito carinho seu exemplo de fé e sua força. July era uma fortaleza. 

quinta-feira, 14 de março de 2013

Pra não dizer que não falei de poesia ...

Cada vez mais me convenço de que os verdadeiros amigos são como as ondas do mar: vão e voltam. Às vezes, demoram um pouco para dar as caras novamente, mas acabam voltando.
Com o tempo aprendi a valorizar os amigos e cobrar menos sua presença, por isso sempre os recebo de braços abertos, sem cobranças. É difícil manter o ritmo da amizade quando não se tem atividades em comum.
Desde que me mudei para Cuiabá - já faz 10 anos - já tive fases em que me achei uma pessoa popular, querida e cercada de amigos e também já tive fases em que me senti a pessoa mais sozinha do mundo, e até me questionei qual era o meu problema. Será que não sou acessível? Sou antipática? Séria demais? Superficial demais? Profunda demais?
É claro que não cheguei a uma resposta conclusiva, e acredito que sou um pouco de tudo misturado.
Já houve fases na minha vida (no Rio de Janeiro, Cáceres, Cuiabá) em que funcionei como aquela pessoa que puxa as coisas, propõe os programas, o elemento agregador do grupo, Mas, não ando assim ultimamente. Não sei se é a idade, mas ando cada vez mais com preguiça de mobilizar as pessoas, convidar, chamar. Se eu puder fazer as coisas sozinha, tudo bem; se não puder, não faço.
Adoro a paz da piscina quando nado na academia, adoro o "quase" silêncio das aulas de yoga ...
Gosto do Chorinho (o bar Choros&Serestas) porque é um lugar onde você vai sem combinar horário com ninguém, chega lá e é sempre bem recebida, pelos garçons, pela maioria dos músicos e pelos clientes habitués como eu ... Na hora que dá vontade, eu pago minha conta e vou me embora para casa.
Temos um novo papa e uma série de coisas graves acontecendo no mundo, como sempre, e eu aqui olhando para dentro de mim no meu horário de almoço, ouvindo Paulinho da Viola. A propósito, olha só o que ele acabou de cantar para mim:

"Eu sou assim
Quem gostar de mim
Eu sou assim"
Meu mundo é hoje - Paulinho da Viola

Esse é meu recado hoje.

"Deixe-me ir
Preciso andar
Vou por aí a procurar
Rir prá não chorar
Quero assistir ao sol nascer
Ver as águas dos rios correr
Ouvir os pássaros cantar
Eu quero nascer
Quero viver...
Deixe-me ir
Preciso andar
Vou por aí a procurar
Rir prá não chorar
Se alguém por mim perguntar
Diga que eu só vou voltar
Depois que me encontrar...

Preciso me encontrar - Cartola

E viva a poesia de poetas como Cartola e Paulinho da Viola no Dia Nacional da Poesia!

sexta-feira, 8 de março de 2013

O sonho não acabou

É inevitável hoje pensar no Dia Internacional da Mulher. 
Confesso que fico até um pouco irritada quando algumas pessoas me cumprimentam pelo dia, mas não posso negar que fico feliz quando recebo um bombom do estagiário ou uma caixa de chocolate do chefe. Coisa de mulher ... Somos sempre tão contraditórias. 
Acho que a data é importante para se refletir sobre violência contra mulher e a questão das diferenças salariais, mas é claro que avançamos bastante, principalmente no Brasil, que é a realidade que conheço melhor.
Mesmo em Mato Grosso, uma terra de homens machistas, vejo muitas mulheres conquistando espaço no campo profissional.
 No campo político, acho que a participação da mulher em Mato Grosso ainda é muito tímida e a maioria das mulheres que se destaca, infelizmente, chegou à política pelas mãos de seus maridos (os Bezerras, Rivas, Maggis da vida, entre outros) e a maioria acaba trazendo para a vida pública os defeitos e práticas de seus companheiros.
É, nossa sociedade é ainda muito machista. Há poucos dias tive que me calar diante do comentário machista de um homem em posição hierarquicamente superior à minha: "Tenho que pagar um bom seguro para que minha mulher não se case com o primeiro homem que aparecer se eu morrer de repente". 
Quase comentei: "Diz para ela que o mercado está difícil e competitivo, e que tem mais homem querendo ser sustentado do que querendo sustentar. Além disso, os mais ricos preferem as mais jovens".
Mas é claro que houve avanços e a gente se dá conta disso assistindo à novela "Lado a lado" - a melhor desta safra de telenovelas. De vez em quando consigo assistir ao final de um capítulo e numa dessas vi a personagem da atriz Marjorie Estiano, a jornalista e professora Laura, falando a uma menina que as pessoas costumam mandar para o asilo de loucos as mulheres que não obedecem (foi o que aconteceu com a Laura na novela). A mesma Laura foi premiada como jornalista, mas perdeu o direito ao prêmio quando descobriram que uma mulher se escondia por trás de um pseudônimo.
Hoje, as redações da maioria dos jornais estão cheias de mulheres, inclusive em postos de comando. Isso tem um lado bom: não precisamos mais nos esconder atrás de pseudônimos, mas é inegável que a profissão de jornalista está desvalorizadíssima em termos salariais, o que acaba - pelo menos, em Mato Grosso - afastando os homens, que preferem ir atrás de carreiras mais rentáveis, como o Direito. Conheço várias jornalistas que fizeram essa troca.
Eu gosto de ser mulher, gosto de poder ser feminina, chorar quando me dá vontade e ter o direito de ser delicada, sem ser chamada de maricas. Procuro ser uma mulher digna, independente, que não apela para o sentimentalismo para conseguir ir em frente. 
Não é fácil. Tem hora que dá vontade de desabar e ter um homem provedor para tomar conta da gente, botar no colo e fazer carinho. 
Tento fazer com que minhas filhas não desacreditem do sonho de viver uma vida a dois, onde caibam sem conflitos a maternidade, a independência de ideias, o amor e o respeito. 
O sonho não acabou...       

sábado, 2 de março de 2013

Elis, o dançarino





Na noite de ontem, uma amiga, Manoela, me ligou. Na hora pensei no Elis, um amigo em comum. Não deu outra: ela ligou para me comunicar o falecimento de Elis A. da Silva, 72 anos, ourives e o melhor dançarino do Chorinho - o bar Choros & Serestas de Cuiabá.
Não fui ao velório, nem ao enterro.  Escrever este texto é uma forma de reverenciar a memória de Elis.
Conheci o Chorinho em 2002, pouco antes de me mudar de Cáceres para Cuiabá, graças um encontro com Manoela em Cáceres. Ela me falou de um lugar onde costumava dançar e combinamos que me levaria lá na próxima vez que eu fosse a Cuiabá.
Não me lembro ao certo, mas provavelmente nessa primeira ida ao Chorinho conheci Elis. Na época ele era o par de Manoela. Os dois dançavam samba juntos divinamente. Manoela devia ter uns 20 e poucos anos. Ficamos amigas e comecei a frequentar o Chorinho em sua companhia quando me mudei para Cuiabá em fevereiro de 2003.
Nossa amizade durou até ela se mudar de Cuiabá, mas quando ela se foi eu já tinha outros amigos no Chorinho - muitos conquistados através dela.
O Elis era uma referência e estava sempre lá aos sábados. Uma figuraça! Gostaria de ter um vídeo dele dançando. Não sei de onde era, se tinha família, onde morava, só sei que ele dançava muito, tão bem que eu até ficava meio sem graça de dançar com ele. Jamais chegaria aos pés de sua partner Manoela.
Às vezes ele me elogiava e parecia que eu tinha ganho a noite.
De vez em quando ele sumia. Sinto que foi deixando de curtir tanto aquele Chorinho apinhando de gente que não deixava muito espaço para seus rodopios e passos de dançarino de gafieira. Quase não o vi mais depois que o Chorinho se mudou para um endereço novo, num local mais requintado.
Uma pena! Aos poucos, figuras como Elis vão desaparecendo. Queria ter dançado uma última vez com ele. Queria poder dizer que ele deve estar dançando numa festa no céu neste momento, mas não tenho esse dom. Sempre vou me lembrar de Elis com carinho e muita saudade de um bom tempo vivido em Cuiabá.
Manoela e Elis em nosso último encontro: um almoço em homenagem a sr. Gaspar,  no Chorinho, em 2012. Sr Gaspar também nos deixou no final do ano passado.


PS. Ele me lembrava um tio, Taciano, irmão do meu pai e uma pessoa bem presente na minha primeira infância.