domingo, 13 de abril de 2008

Pollyana

Quase toda mulher na faixa dos entas leu o livro "Pollyana" uma vez na vida. Ontem, por acaso, conversando com uma amiga do prédio (da faixa dos 30) comentei sobre "dar uma de Pollyana" e ela me disse que tinha acabado de reler o livro para a filha de 13 anos. Para quem não conhece, "Pollyana" é um daqueles eternos best-sellers que acaba interferindo na nossa vida pro bem ou pro mal. Já não me lembro dos detalhes do livro, lido há dezenas de anos, mas o que ficou é a lição de sempre procurar o aspecto positivo de tudo. Um exemplo fictício: você foi assaltado, mas pense que poderia ter sido pior, você poderia ter morrido. Enfim, funciona mais ou menos desse jeito: pense que sempre poderia ter sido pior. A religião católica (que conheço melhor do que outras) também tem esse viés e ensina que devemos sempre agradecer a Deus por tudo.
Essa filosofia me irrita um pouco. Tenho vontade de fazer o papel do advogado do diabo e questionar: o que dizer para uma família que perde, por exemplo, um filho pra uma doença besta como a dengue ou num acidente? Provavelmente, algumas pessoas vão dizer: "foi a vontade de Deus". Isso me deixa meio angustiada: qual vai ser a próxima vontade de Deus?
Para variar, meus pensamentos tortuosos acabaram me levando a outro caminho. Na verdade, minha intenção hoje era "brincar" um pouco de Pollyana. Ontem, à noite, assisti ao filme "O caçador de pipa" (sim, eu li o livro, mas o filme é também muito bonito e tocante) e saímos, minha filha de 16 anos e eu, comovidas com a história dos amigos Amir e Hassan. Fiquei pensando na loucura que é viver no Afeganistão, no quanto aquele povo sofreu nas mãos dos russos, dos talibãs e provavelmente sofre ainda. Pensei também nos Amirs e Hassans do Iraque, em meio a uma guerra maluca que parece não ter fim. Pensei também quando cheguei em casa na vida boa que tenho, na minha caminha gostosa e, por um momento, agradeci ... a quem? Não sei. Ao mesmo tempo, pensei nas pessoas quem não têm essa caminha gostosa, como posso me sentir bem com uma situação tão injusta?
Pensei também que alguma coisa me impede de dar mais, fazer mais por esse mundo e pensei também na minha mediocridade, nas minhas preocupações mesquinhas com tudo que preciso pagar e na minha conta bancária quebrada. Pirei. Pensei também nas pessoas que têm muito dinheiro, mas que às vezes se sentem impotentes diante de filhos distantes, drogados e autodestrutivos. Agradeci novamente por minhas filhas maravilhosas, de coração bom e cheias de propósitos positivos na vida, como eu. E de novo pirei porque não sei o que devo dizer para elas, ensinar a elas de modo que tenham uma vida ainda melhor que a minha, no sentido de auto-realização. Não sei. Neste momento, a única certeza que tenho é que quero estar perto delas para o que der e vier.

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