segunda-feira, 15 de março de 2010

No limite

Um dos problemas recorrentes em Cuiabá e em todo estado de Mato Grosso é o da mão de obra. Volta e meia, uma matéria veiculada na mídia anuncia que estão sobrando vagas no mercado, porém, ao mesmo tempo, vemos pessoas sem trabalho ou subempregadas.
Eu mesma já fiz reportagens na revista Produtor Rural abordando o tema: os melhores cargos nas novas indústrias que vão se espalhando pelo estado têm que ser ocupados por gente de fora porque falta mão de obra capacitada. O caso da unidade da Sadia em Lucas do Rio Verde (a 330 km da capital, no médio-norte mato-grossense) , que acompanhei de perto por dever de ofício, é exemplar: a empresa, que dispensa apresentação, foi obrigada a "importar" trabalhadores por não dispor de mão de obra qualificada na região. Em outubro passado, quando fiz uma reportagem na região, 75% dos cerca de 3.700 empregados tinham vindo de estados do Nordeste.
E quem vai capacitar a mão de obra daqui? Senai e outros órgãos ligados ao governo ou à iniciativa privada têm feito algum esforço nesse sentido, mas parece que não é suficiente.
Quero trazer um ingrediente "novo" para essa discussão. Conversei há poucos dias com uma empresária de Cuiabá, cujo nome prefiro não revelar: ela tem um negócio bastante próspero no ramo de serviços (alimentação) e esbravejava num final de expediente sobre a carência de pessoal para trabalhar em suas lojas. Sua empresa emprega somente rapazes, que são treinados para realizar o serviço. Ela contou que chega a contratar vários rapazes de um mesmo bairro, mas vive enfrentando problemas de rotatividade. No dia da nossa conversa um rapaz tinha sido demitido porque (pelo menos, foi o que entendi) fez uma coisa errada de propósito, gerando reclamações do cliente.
A empresária se queixou basicamente da falta de caráter de seus jovens empregados. São rapazes que vivem no limite da marginalidade: se não são bandidos, convivem com muitos e podem facilmente se transformar em um.
Penso que essa empresária e seu marido têm a chance de mudar a sorte de muitos deles. Talvez até mudem, mas é triste constatar que alguém quer dar emprego, tem gente precisando trabalhar, porém por alguma razão a equação não fecha. Pretendo voltar a esse assunto com ela para entender melhor o que se passa e adoraria fazer uma reportagem ampla e profunda sobre o tema.
Conheço bem outro casal que também atua no setor de alimentação e enfrenta problema semelhante, embora gerencie um negócio bem menor. Um dos rapazes já trabalha com eles há um tempão, porém vários outros passaram (em geral, amigos ou conhecidos do já citado) e alguns tiveram problemas com a polícia. Um deles foi preso há meses por ter matado um cara por motivo fútil. Até então ele trabalhava como garçon e parecia um rapaz muito gentil, daqueles que você é capaz de convidar para ir à sua casa. Paradoxos do ser humano que, numa cidade como Cuiabá, ficam mais evidentes.



2 comentários:

Roça de Livros disse...

Oi Martha,
Fiquei curiosa com o tema que você levantou.

Também ouço aqui em Madalena muita queixa de empregadores sobre a mão de obra local, especialmente na zona rural.

Eu gostaria de saber a versão dos empregados (e desempregados). Pelo que vejo aqui, desconfio que uma parte do problema tem a ver com atitudes dos empregadores e com problemas de insatisfação e baixa auto-estima dos trabalhadores. Talvez psicólogos tenham explicações. (Tem um grupo na UnB que estuda psicologia do trabalho).

Ah, é surpreendente que a Sadia tenha encontrado no Nordeste a mão de obra qualificada que não acha em MT!

Sua matéria ampla e aprofundada seria muito bem-vinda! Se fizer mesmo, não deixe de me avisar da publicação, ok?
Terezinha

Martha disse...

Infelizmente, esse é um tema que não cabe na revista onde trabalho em toda sua amplitude, mas de repente posso fazer um frila sobre o assunto.
Pode deixar que te aviso se rolar.
Obrigada pelo comentário!