quarta-feira, 25 de novembro de 2009

"A implosão da mentira"

"Mentem, sobretudo, impune/mente.
Não mentem tristes. Alegremente
mentem. Mentem tão nacional/mente
que acham que mentindo história afora
vão enganar a morte eterna/mente."
Esses versos foram tirados de um poema maravilhoso de Afonso Romano Sant'Anna, "A implosão da mentira", e dizem respeito ao episódio do Riocentro - o caso da bomba que explodiu no colo de um militar no estacionamento de um centro de eventos onde se realizava um show de MPB em comemoração ao Dia do Trabalho. O caso ocorreu em maio de 1980, no governo do ex-presidente João Baptista Figueiredo, e os tempos eram outros. Shows do gênero ainda eram considerados atos políticos e podiam ser alvo de atentados à bomba.
Em cima do fato, foi armada uma farsa política em que os militares, por meio de um IPM (Inquérito Policial Militar), sustentaram a versão de que os dois militares tinham sido vítimas de um ato terrorista de esquerda, é claro. Ambos serviam no Doi-Codi no Rio de Janeiro. Um deles, o sargento Guilherme Pereira do Rosário morreu no local e o capitão Wilson Luís Alves Machado ficou gravemente ferido, recuperou-se, mas nunca comentou o assunto publicamente.
O poema de Sant'Anna retrata bem o choque entre as evidências do que tinha acontecido e a versão apresentada pelo governo militar.
Eu me lembrei dessa poema hoje, no supermercado, enquanto lia a chamada de primeira página de um jornal cuiabano dizendo que os seguranças envolvidos no caso da morte do vendedor ambulante Reginaldo Donnan, no Shopping Goiabeiras, sustentaram perante o juiz a versão de que ninguém o espancou. Sua morte teria ocorrido em consequência de uma queda na escada.
E quanto às imagens que cansamos de ver na TV em que o vendedor é levado num container até a viatura da PM (e que foram até alvo de uma "brincadeira" numa festa à fantasia realizada na capital há cerca de um mês)) e aos depoimentos de uma ascensorista e de um encarregado da limpeza que dizem ter visto um homem desfalecido e ensanguentado, e muito sangue nas paredes da sala para onde foi levado?

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