Como este espaço é meu, tento ser o mais sincera possível. Esta introdução é para falar do conflito que existe dentro de mim a respeito de minha ida a Brasnorte. Vou fazer um paralelo entre a minha história pessoal e a do produtor rural Edward Rossi Vilela, o principal personagem da minha matéria. Em 1975, enquanto o mineiro Edward comprava terras no noroeste de Mato Grosso, eu estava no Rio de Janeiro, no primeiro ano do curso de jornalismo da UFRJ, cheia de sonhos na cabeça. Hoje, ainda tenho sonhos, mas são de outra natureza e, às vezes, confesso chego a desconfiar deles.
Trinta e três anos depois eu estou em Mato Grosso e trabalho numa revista da Famato (Federação de Agricultura e Pecuária do Estado de Mato Grosso) que se chama "Produtor Rural". É claro que continuo fiel à proposta de fazer bom jornalismo - ouvir os dois lados, buscar a informação que é do interesse público -, mas é inegável que hoje conheço mais o lado do produtor rural, que não é mais uma abstração mental ou uma imagem perdida no passado. Ele tem rostos, nomes e dramas como o do sr. Edward, que jura ter ido à Funai para levantar a situação das terras que ia comprar e não encontrou qualquer obstáculo. Hoje ele corre o risco de perder suas terras que estão a um passo de se transformar em terra indígena.
Não quero aqui contar detalhes da matéria que fui apurar em Brasnorte (quem se interessar pode ler em Produtor Rural), mas apenas mostrar que o mundo hoje é bem mais complexo do que supus na adolescência, em que o povo da "esquerda" parecia sempre ser do bem e o da "direita" do mal. Nessa história toda, para mim, índios e muitos produtores rurais são apenas vítimas de um processo de desenvolvimento meio torto, que teve um de seus capítulos mais dramáticos durante a ditadura militar. É claro que tem muita gente se beneficiando de eventuais conflitos entre produtores e índios, produtores e MST, etc. Mas, uma coisa é certa, o povo do litoral (do qual fiz parte por um bom tempo) acaba tendo uma visão distorcida dos fatos, assim como muitas pessoas aqui do Centro-Oeste têm uma visão preconceituosa em relação ao que ocorre em cidades como o Rio e São Paulo.
Eu me lembro de uma música do Mílton Nascimento que dizia "A novidade é que o Brasil não é só litoral/ É muito mais que qualquer Zona Sul"... Para mim, antes, isso era só poesia; agora virou verdade.
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