terça-feira, 19 de outubro de 2010

Minha fama de mau

Bem que esse podia ser o mote do programa de um candidato a um cargo político, mas é apenas o título do livro do compositor e cantor Erasmo Carlos que acabei de ler.
Gosto de compartilhar aqui os livros e filmes (a propósito, preciso comentar um filme incrível que vi no último fim de semana em DVD).
O livro de Erasmo (Editora Objetiva, 2008) é sedutor e se assemelha graficamente à biografia do compositor e cantor Tim Maia, escrita por Nélson Motta. Coincidência ou não, ambos - Erasmo e Tim - conheceram-se quando ainda eram guris no bairro carioca da Tijuca e viveram algumas aventuras juntos ao longo do tempo. Tanto o livro de Erasmo quanto de Tim são pródigos em fotos e trazem fotos em close do biografado na capa e contracapa.
Erasmo, entretanto, optou por ser o autor de sua própria história (o texto final é assinado por Leonardo Lichote, cujo nome aparece na parte interna da obra). Se, por um lado, essa opção acaba aproximando mais o leitor do artista, que conta na primeira pessoa casos de sua infância, adolescência e vida adulta - passando pela iniciação musical e o período áureo da Jovem Guarda -, por outro ela esbarra na limitação do autor como escritor.
O livro começa seguindo uma certa ordem cronológica, que é abandonada a partir do capítulo 3, totalmente dedicado ao amigo Roberto Carlos. Este capítulo traz histórias interessantes como a do show dos Doobie Brothers em Los Angeles, quando Erasmo menciona a "preocupação de Roberto com vírus e micróbios" e conta que foi confundido com o Mr. Carlos mais famoso por um executivo da gravadora RCA Victor.
Ao longo do livro, surgem facetas inusitadas de personagens como Wanderléa, Carlos Imperial, Ronnie Von e o próprio Tim Maia, entre muitos outros. Para quem, como eu, era menina na época da explosão da Jovem Guarda, é um prazer ler informações sobre os bastidores do programa que marcou época na TV brasileira.
O livro é uma coletânea de crônicas de época. Conta sobre a participação de Erasmo no primeiro Rock in Rio em 1985 (que lhe legou um trauma), mas decepciona quando salta subitamente de uma relação maravilhosa (e dar inveja a qualquer um) do cantor/compositor com sua mulher Narinha (a musa de "Coqueiro verde") para a separação do casal. O autor não dá nenhuma pista sobre os motivos do fim do casamento. No subcapítulo "Saudade com sorriso", Narinha reaparece por causa de sua morte em 26 de dezembro de 1995.
"Até hoje, falr do assunto mexe com meus sentimentos. Mesmo porque não sei lidar com a forma como ela se foi, tirando sua própria vida" - diz o autor.
Eu não me lembrava de que Narinha tinha se suicidado e ficam perguntas sem respostas: o que aconteceu com os dois? Que motivos levaram uma pessoa tão amada, aparentemente tão feliz a se matar?
Talvez esse não seja o objetivo do livro e provavelmente - e aí volto ao ponto inicial - o autor tenha se autocensurado ao contar sua vida. De qualquer maneira, a leitura de "Minha fama de mau" é quase sempre agradável, embora deixe um gosto de decepção na boca.
Para quem é fã de carteirinha da dupla Erasmo & Roberto, é um produto a mais, fartamente ilustrado; para quem é um fã normal, como eu, é uma forma de conhecer um pouco mais a personalidade de um ícone da Jovem Guarda - a do Carlos que sempre ficou meio ofuscado por aquele que foi "ungido" rei.  E para quem não é fã mas estiver disposto a ler, o livro vale como fonte de informações sobre um período rico da música brasileira (anos 60/70/80).

PS. Li esse livro logo depois de "Carmen - uma biografia", de Ruy Castro, que tem outra embocadura.
 Agora estou entre retomar a leitura de "Um homem mau", livro de estréia do consultor mineiro Wilson Britto, recém lançado pela Editora Entrelinhas de Cuiabá, e "Manual da paixão solitária" do gaúcho Moacyr Scliar, um dos meus escritores preferidos. Como é bom ler!

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