sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

Sozinha

Volto a Cuiabá depois de mais de um mês ausente. É bom chegar em casa. É bom ter casa, o nosso canto.
Estou me sentindo meio sozinha. Minhas filhas estão curtindo mais alguns dias de férias em sua cidade natal e hoje a mais velha, ao telefone, cometeu um ato falho: perguntou o que eu trouxe de presente para sua mãe, querendo se referir à sua querida tia Márcia, em cuja casa está hospedada.
Fiquei meio sentida pelo fato de não tê-las encontrado e não ter ninguém à minha espera. É difícil lidar com isso, é perturbador e, ao mesmo tempo, libertador.
Apesar de todo carinho da família - tão imenso que às vezes chega a ser sufocante -, estou numa fase em que estou me sentindo desimportante, desinteressante. Talvez retomar o blog me ajude a retomar meu eixo. Há questões fortes e importantes que me atropelam: como conseguimos viver num mundo tão desigual? Enquanto uns se matam por comida, outros comem até se empanturrar ou jogam comida fora. Enquanto uns consomem tanto, gastam tanto em marcas e grifes, viajam, passeiam e se hospedam em hotéis maravilhosos, outros perdem o sono à noite com medo de enchentes e desabamentos.
Eu gostaria de ser menos egoísta, menos superficial, sinceramente. Queria ser mais segura, ter mais certezas, mais fé - em Deus, nos homens e em mim mesma.
Hoje, durante uma parte do voo de São Paulo para Cuiabá, li mais alguns contos de um livro muito legal que comprei na livraria do aeroporto. Chama-se "Clarice na cabeceira" (Editora Rocco - 2009) e traz alguns contos de Clarice Lispector selecionados por leitores como Lia Luft, Maria Bethânea, Malu Mader e Fernanda Takai. Descobri há pouco tempo que conheço muito pouco a obra de Clarice e resolvi começar a compensar essa falha e, modestamente, aprender um pouco com ela. Gostei de vários contos, mas fiquei especialmente impressionada com "A bela e a fera ou A ferida grande demais", escolhido pela atriz Letícia Spiller. Ele narra um encontro entre uma dondoca e um mendigo na Avenida Atlântica e mostra de uma forma brilhante - e também engraçada - a identificação que a moça vai sentindo em relação ao pedinte, embora estejam em situação financeira tão oposta. Ela se dá subitamente conta da mentira e superficialidade de sua vida. "Eu - eu estou brincando de viver. Ter uma ferida na perna - é uma realidade" - diz.
Às vezes também tenho essa sensação, mas prefiro o conforto de não ter uma ferida na perna.
Preciso me apaixonar - por alguém, por alguma coisa.

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