segunda-feira, 25 de janeiro de 2021

O meu lugar

Foto de Luciana Silveira

Há dias quero deixar registradas algumas lembranças da minha recente temporada no Rio de Janeiro. Foi um período estranho. Não eram férias propriamente (trabalhei assiduamente e mantive minhas atividades on-line até a véspera do Natal) e ainda havia a sombra (e que sombra!) da pandemia.

Aliás, este foi um tema recorrente ao longo de mais de dois meses passados na casa de minha irmã no bairro de Ipanema. Não havia consenso na própria família e cheguei à conclusão que em matéria de Covid-19 cada um tem uma opinião, usando os argumentos e os fatos (ou fake news) a seu favor. Não tentei convencer ninguém da "minha verdade" e sobrevivi a esses embates.

Tudo melhorou quando recorri a uma lição já apreendida em viagens passadas. Caminhe, respire fundo e vá em frente. Tudo fica melhor. Nem sempre dava para seguir isso à risca porque houve dias seguidos de chuva e aí era impossível sair caminhando debaixo d'água, correndo o risco de pegar uma gripe que poderia ser confundida com Covid. Porém a volta do sol (ou, pelo menos, de um dia nublado) era saudada com muita alegria. 

Nessas idas e vindas, a melhor parte foi redescobrir alguns lugares do Rio. Por conta dos riscos da pandemia, não valia a pena ir muito longe, ficar pegando transporte público ou carros via aplicativo. Mesmo assim fiz um passeio delicioso no velho Aterro do Flamengo, um lugar que mora no meu coração, já que passei a maior parte da minha infância e juventude no bairro do Flamengo. Realizei um sonho ao passear de bicicleta com uma de minhas sobrinhas no Aterro. Confesso que fiquei com um pouco de medo pois não pedalava desde 2013, mas foi muito gostoso. Deu aquele gostinho de infância, que é até difícil de descrever. Na volta, fiz questão de fazer uma foto diante da minha primeira escola. 


Outro lugar redescoberto foi a Lagoa Rodrigo de Freitas, situada a duas quadras de onde estava hospedada. Que lugar estupendo, cheio de nuances! Aos finais de semana, há muita gente e é um pouco estressante passear se esquivando de ciclistas e transeuntes em geral, mas nos dias comuns a Lagoa fica mais tranquila. Encarei a volta completa (sozinha) três vezes - um percurso de aproximadamente 7,5 km. Confesso que da primeira vez foi duro, porém o fato de não ter levado dinheiro acabou me propiciando um encontro delicioso com Luciano, o "doutor em coco", que me vendeu fiado sem nunca ter me visto mais gorda. É claro que voltei para pagar a dívida e virei freguesa. 



Também tive o prazer de retornar ao Jardim Botânico, um lugar único que nunca me canso de visitar. Caminhar por suas alamedas é uma experiência que recomendo a todos os amigos (e aos inimigos também). E pensar que morei tão perto perto de lá e, durante um tempo, até corria no Jardim Botânico!

Mas a cereja do bolo nesta minha temporada pandêmica foi a Praia do Arpoador. Nunca fui frequentadora do Arpoador e nas últimas vezes que fui ao Rio sempre ia até o final da praia pelo calçadão para apreciar a bela vista do Morro Dois Irmãos, com a Pedra da Gávea ao fundo. Desta vez comecei a caminhar pela areia indo até a altura do Posto 9, quando me encontrava com duas sobrinhas, e íamos até o final do Arpoador para mergulhar bem no cantinho, um lugar mágico onde quase sempre a água parece limpa e o mar menos forte do que no restante de Ipanema.  Em alguns dias, a temperatura estava gelada e dava até para ver peixinhos... 


Como íamos relativamente cedo, não havia aglomeração, a não ser de cachorros em alguns trechos. Eu amava e ficava imaginando ter a companhia de Lola (a cadelinha da minha filha Marina, que hoje mora em Goiás).  Por coincidência, compartilhei algumas idas à praia com uma amiga querida recém-chegada de Paris e, como ela estava hospedada no final de Copacabana, o Arpoador acabou sendo nosso ponto de encontro.  

Houve um dia em que, ao invés de caminhar pela praia desde o Posto 10, fui andando pelas ruas internas de Ipanema até o Posto 9. Foi tão bonito ver o movimento dos porteiros varrendo as calçadas. Parecia um balé sincronizadoNo caminho pude admirar as orquídeas que florescem na maioria das árvores.

O Rio tem fama de perigoso, é perigoso, e está muito degradado, mas quantas belezas esta cidade ainda nos oferece!  As ruas dos bairros têm vida. Teve um dia que fui e voltei de Ipanema a Copacabana a pé para ir a um dentista. Foi cansativo, mas compensador. Quando você caminha pelas ruas do Rio você vê movimento, vê pessoas dos mais variados tipos. E tem mais um detalhe, apesar da pandemia, as pessoas são simpáticas em geral: ainda é possível, se houver disposição, começar uma conversa do nada com alguém que você conheceu na praia, pedindo para olhar suas coisas durante um mergulho, ou até enquanto esperar o sinal abrir para atravessar a rua. 

 Sinto muita falta disso em Cuiabá. 

Nos meus primeiros dias de volta a Cuiabá, confesso que estranhei a ausência de pessoas nas ruas, em parte motivada pelo calor intenso e, em parte por um hábito cultural.  

Meu objetivo não é comparar as cidades ou me queixar do lugar onde estou (até quando? quem sabe?) e sim reviver momentos gostosos, e poder compartilhá-los com quem eventualmente ler esta crônica. 

Por isso agradeço imensamente à minha irmã Jane que me acolheu e a todos que compartilharem estes momentos tão agradáveis comigo. 

Até breve, Rio de Janeiro!

11 comentários:

Maria Bel Baptista disse...

Que lindo texto Marthinha . Vejo o Rio assim na Pandemia. Tudo muito perto, caminhar e caminhar ... mar e mar ... e orquídeas ... amei se passeio pelas letras, muito indo . Não vejo a hora da sua volta por aqui . Até breve .

Lu disse...

Adorei o texto. Tive até créditos. Hj cedo lembrei de vc, pq fui de bike até a praia vermelha e dei um mergulho lá. Podemos fazer isso na próxima. Vc faz falta aqui no Rio. Bjs

Martha disse...

Obrigada, Bel e Lu, parceiras de muitos desses passeios! Senti falta de uma ida à Praia Vermelha e também a subida no Morro da Catacumba (acho que é esse o nome). Mas, considerando os limites enfrentados durante a pandemia, acredito que ainda saí no lucro. Vocês também fazem falta aqui e espero em breve poder reencontrá-las, no Rio ou em MT. Beijos

Vera Capilé disse...

Lindo texto Martha! Aliás, como tudo que vc escreve! Vi o Rio por suas palavras! Parabéns!!!!

Martha disse...

Obrigada, Vera!!! Beijos

Beth Saboya disse...

Adorei, seu texto, Martha! Faz tempo w não vou ao nosso Rio! 😘

Martha disse...

Obrigada! Precisa voltar lá...

Unknown disse...

Sempre sensível.
Adoro seus escritos, a cada parágrafo um novo encontro. Beijos e abraços, Martha!

Unknown disse...

No Rio você vê movimento de pessoas nas ruas inclusive durante a noite. Também sinto muita falta disso em Cuiabá.

Martha disse...

Quem é você "Unknown"? Deve ser alguém que me conhece bem e que conhecer bem o Rio de Janeiro. Quando for assim, basta colocar seu nome no final do comentário. Fica a dica para a próxima oportunidade. Beijos

Barbara disse...

Por minha irmã caçula morar no Rio acabo indo com frequência para lá. Agora menos frequentemente do que gostaria. Seu texto me fez viajar na minha experiência de não-turista e não-moradora do Rio de Janeiro, essa cidade linda, cheia de gente simpática com lugares únicos.