sexta-feira, 15 de janeiro de 2021

À minha irmã Junilza

Hoje minha irmã Junilza nos deixou. Mais do que irmã, ela foi minha mãe na minha primeira infância.

Quando nasci, Junilza tinha 22 anos (fez 23 alguns meses depois). Eu me lembro mais dela e de minha outra irmã Jandira (que tinha 17) cuidando de mim do que minha própria mãe, que era muito dedicada a meu pai, na época com 62 anos e com problemas de saúde (ele faleceu aos 67)

São lembranças gostosas. Eu me lembro de Junilza fazendo "aviãozinho" para a irmã enjoada comer. Eu me recordo dela tocando piano quando já morávamos no apartamento da Rua Almirante Tamandaré, no Rio de Janeiro. Ela tocava "Num Mercado Persa" (de Albert Ketelbey) e eu era transportada para o Oriente, dançando como uma louca. 

Eu me lembro de quando viajou para a Europa numa excursão da Polvani e me encheu de presentes na volta.  Eu me recordo de dois bichinhos de feltro que fez para mim: um deles era um veadinho, que eu chamava de Bambi. Lindo!

Embora fosse mais velha que Jandira, Junilza se casou um ano depois, exatamente no dia 11 de abril de 1964. "Perdi" duas irmãs/mães em pouco mais de um ano e, aos poucos, minha outra irmã, Jane, foi assumindo este papel.

Junilza se mudou para o subúrbio do Meier e tenho boas lembranças dos finais de semana que passei lá num prédio pequeno, numa rua calma. Aos poucos, vieram os filhos - Augusto, Júlio e Simone -, e eu fui crescendo e cedendo o lugar de "filha". Eu me tornei a "tia", a comadre, já que batizei Augusto ainda menina, a convite de meu cunhado César. 

Junilza e família se mudaram para o Flamengo, ficando mais perto de nós por um tempo e, alguns anos depois, se transferiram definitivamente para Brasília. Nossos encontros, entretanto, continuavam relativamente assíduos. 

Anos depois, em 1997, quando viajei para os EUA a convite do Rotary Club de Cáceres, numa viagem de intercâmbio, ela, já viúva, atendeu meu pedido e ficou 15 dias cuidando de minhas filhas Diana e Marina (Anna Maria, minha irmã de Corumbá, tomou essa responsabilidade nos outros 15 dias). 

Desde então, nossa relação voltou a ficar muito próxima e nos tornamos irmãs de fato. Foram várias idas a Brasília e vi minha irmã florescer novamente. Ela era muito alegre, mãe dedicada e avó amorosa de Felipe e Leila. Como costurava bem!!! Entrou no grupo de costura da igreja e se dedicava com afinco às tarefas que lhe eram dadas. Participava de uma turma de alongamento e lá também cultivou belas amizades.

Nos últimos anos, não estava bem de saúde e quase nos deixou algumas vezes. Era magrinha, parecia frágil, mas como lutava pela vida. A gente conversava toda semana (em geral, nas noites de domingo) pelo telefone - longos papos em que falávamos sobre assuntos diversos, principalmente filmes, programas de TV, música e lembranças. 

Em 2018, passei o Natal com ela e, em julho de 2019, estivemos juntas pela última vez. Em 2020 - esse ano esquisito - não pudemos nos encontrar, mas parece que estivemos tão próximas! Ela assistiu à minha live no "Ixpia, o Festival" em setembro, e também acompanhou o meu "Papo de Quarentena" com Sofia Karam, nossa sobrinha-neta, em dezembro. 

Não sei dizer exatamente qual foi o último dia que nos falamos. Provavelmente foi logo depois do Natal. Sentia que ela estava cada vez mais cansada e queria poupá-la. Nas últimas três vezes que liguei sequer consegui falar com ela e sabia que não haveria milagre: minha irmã estava se apagando, concluindo seu ciclo entre nós.

A fé de algumas sobrinhas e amigas me consola. Sei que Junilza lutou o bom combate, foi íntegra e viveu intensamente seu amor por nossos pais, irmãos, seu marido, filhos e netos, amigos. 

Escrevi este texto para me permitir sentir a dor de sua partida e também para compartilhar algumas lembranças com meus sobrinhos.

 Escrevo ao som de Chopin - um de seus compositores preferidos. Junilza me ensinou a tocar piano. Hoje não toco mais. Infelizmente, vendi meu piano - o instrumento onde aprendi a tocar - quando este não conseguiu entrar no meu atual prédio. Ele me acompanhou até Cáceres nas diversas casas onde morei. 

Quem sabe um dia terei a oportunidade de tocar novamente "Tristesse" numa versão facilitada ou a "Sonata ao luar", de Bethoven, uma das minhas favoritas. Uma coisa é certa: sempre vou me lembrar de Junilza quando ouvir alguém tocando piano. Descanse em paz, minha irmã. Você ocupará para sempre um lugar muito especial no meu coração. 

PS. O nome Junilza vem da junção entre os nomes de nossos pais: Júlio e Nilzalina. Conheci há algum tempo uma caixa num supermercado de Cuiabá que se chamava Junilza. Foi a segunda Junilza que conheci.

Junilza em uma das fotos tiradas por seu filho Augusto César

27 comentários:

Maria Bel Baptista disse...

Que emocionante ler a sua homenagem à tia Junilza . Em 2015 ficamos eu e Sofia na casa da tia Junilza durante 5 dias . Foi uma delícia ver ela mostrando os álbuns de fotos e contando as histórias da família . Ver Augusto, Simone, Julio e estar com todos eles, naquela casa linda e ela mostrando todas as árvores frutíferas (e nós só catando amora as plantas e depois passearmos de carro com ela . E visitar eles no Méier era um dos passeios que eu mais apreciava no Rio de Janeiro . Bjsss Marthinha ; obrigada por compartilhar essas lembranças da tia Junilza

Maria Bel Baptista disse...
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Martha disse...

Grata pelo comentário, Bel! Teria muito mais para contar, mas optei pelas lembranças que vierem à minha mente, sem racionalizar muito. Deixe a emoção falar mais alto.
Beijos

Vera Capilé disse...

Que lindo Martha! Lindo expressar seu amor, a dor da perda, num texto tão singelo e cheio de festas lembranças! Que bom que vc entende que o ciclo de Julniza encerrou! Certamente estará em outro plano livre de doenças e pesares! Meus sentimentos Martha!

Vera Capilé disse...
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Gerson Luiz Caetano disse...

Fico triste pela sua falta mas me alegro em ver tantas lindas lembranças aqui declaradas...que Deus conforte a todos os seus.

Sol disse...

Lindo e emocionante... Li com tanto envolvimento que pareceu-me participar um pouco das suas vivências, talvez por ser também irmã caçula, ter vivenciado o retorno, tbm recente da minha irmã mais velha. Abraço com ternura, Martha querida!🌹✨

Martha disse...

Muito obrigada a todos pelas mensagens! É muito bom compartilhar nossos sentimentos e lembranças com os amigos.

Beth Saboya disse...

Que pena, Martha, meus sentimentos! Cada um tem q cumprir seu tempo... Pela foto, ela me lembrou mto a Lila, e me deu saudades dela. Quantas lembranças boas vc tem! Um beijo!

Antonio Padua Alves disse...

Texto muito sensivel e envolvente!!

Martha disse...

Sim! Elas eram bem parecidas. Um beijo.

Martha disse...

Obrigada!!!

João Mattos disse...

Que lindo depoimento sobre sua irmã, Martha. Um abraço muito grande para você, fique bem.

Martha disse...

Obrigada!!!

Lu disse...

Assim como para a minha mãe, vc fez uma linda e doce homenagem à tia junilza. Ela teria gostado de como a descreveu.

Martha disse...

Obrigada, Lu! Só reproduzi o que elas foram para mim.

Unknown disse...

meus sentimentos, martha, querida. muita força p vcs atravessarem aí esse processo...grande abraço!

Clubedoalexa disse...

Meus sentimentos minha amiga querida. Que Deus conforte o seu coração e a toda sua família nesse momento de dor. Da forma como você a descreve ela viveu sua vida plenamente. Com certeza deve estat em um bom lugar.

O porquê disse...

meus sentimentos lindo texto

O porquê disse...

Aqui é Keka

O porquê disse...

meus sentimentos lindo texto

Terezinha Costa disse...

Martha querida, sinto muito por sua perda. Suas lembranças são comoventes. Lembranças assim são o principal legado que se pode deixar para filhos, netos e sobrinhos-netos. Tenho certeza de que os seus saberão dar valor a isso. Um beijo carinhoso para você.

Martha disse...

Obrigada!!!

Martha disse...

Obrigada, Terezinha!!!

Martha disse...

Tomara! Obrigada!!!

Bruno Lourenço Reis disse...

Um abraço apertado pra você e toda a família. Junilza foi uma mãe para todos os amigos em Brasília.

Martha disse...

Obrigada! Um abraço.